Lei Simplificada

sábado, 18 de outubro de 2014

A sonegação fiscal e a suspensão da punibilidade


              Quando alguém comete um crime contra a ordem tributária, nasce para o Estado o direito de punir o autor desse crime. Porém se o contribuinte procurar a Fazenda Pública e fizer o parcelamento da dívida antes do recebimento da denúncia, a pretensão punitiva fica suspensa enquanto durar o parcelamento. 

             Ou seja: até que o juiz receba a denúncia pelo crime tributário cometido, há a possibilidade de parcelar a dívida e com isso evitar uma ação penal.

          Enquanto durar o parcelamento, a pretensão punitiva estatal fica suspensa e não corre a prescrição do crime. Ou seja: se o contribuinte deixar de pagar as parcelas do acordo efetuado, o Estado volta a ter o chamado jus puniendi. Mas se ocorrer o contrário, ou seja, se o contribuinte pagar a totalidade do parcelamento, extingue-se a punibilidade.

Veja também: responsabilidade civil pelos atos ilícitos dos incapazes

sábado, 11 de outubro de 2014

Bem impenhorável: vai a leilão ou não vai?


Breve história do processo de execução de dívidas
         
          Houve uma época em que o devedor respondia pessoalmente pela sua dívida. Ou seja: a pessoa do devedor é que respondia pela dívida. Na antiga Roma o credor podia se apropriar da pessoa do devedor, escravizá-lo e até vendê-lo em partes - há controvérsias quanto a esse último detalhe -. Já a partir do Iluminismo, a responsabilidade pela dívida saiu da pessoa do devedor e passou a abranger apenas o seu patrimônio - bens, direitos e ações -, situação essa que perdura até hoje. 

Como é feita a cobrança de dívidas hoje
           
        Atualmente, se alguém é executado judicialmente por uma dívida que possui, o Oficial de Justiça vai até a residência do devedor - ou até o local em que os bens do devedor se encontram - e efetua a penhora. A penhora é um ato pelo qual o Estado - presente através do Poder Judiciário - retira bens do patrimônio do devedor e, ou leiloa esses bens para angariar dinheiro para pagar o credor ou entrega os próprios bens ao credor. Essa última hipótese é chamada de adjudicação e ocorre quando, não havendo arrematantes no leilão, o credor, através de seu advogado, requerer ao juiz a adjudicação do bem.

Bens impenhoráveis         

           Nem todos os bens do devedor são passíveis de penhora. Isso se fundamenta no fato de que, se fosse possível penhorar todos os bens do devedor, muitos devedores ficariam em uma ruína financeira absoluta. 
      
        Eis algumas das categorias de bens impenhoráveis: primeiramente o salário - remuneração de funcionário público ou trabalhador em atividade, pro labore de empresário, aposentadoria, etc -, que só pode ser penhorado para pagamento de pensão alimentícia, e, mesmo assim, apenas em parte e não em sua totalidade. As aplicações financeiras, até o limite de 40 salários mínimos, também são impenhoráveis.

           Se o devedor possuir apenas um bem imóvel residencial no qual ele mora com sua família, esse bem é impenhorável. A impenhorabilidade do único imóvel residencial continua valendo mesmo no caso em que o devedor reside em outro local, desde que ele alugue a casa da qual é dono para, com os proventos obtidos com esse aluguel, pagar a locação da casa onde mora. Já se firmou nos tribunais brasileiros o entendimento de que há impenhorabilidade também no caso em que o devedor é solteiro, viúvo ou separado, se ele possuir apenas um imóvel residencial.

           Também são impenhoráveis os móveis, que só poderão ser penhorados em caso de duplicidade - por exemplo: se a pessoa possui duas TVs, uma delas pode ser penhorada - ou se o devedor possuir móveis luxuosos - por exemplo: uma peça decorativa assinada por um artista famoso com alto valor de mercado -.

           Os instrumentos de trabalho também não podem ser penhorados, desde que sejam necessários ou úteis ao exercício de qualquer atividade ou profissão. Já houve um julgamento em que se decidiu determinar o levantamento - cancelamento - da penhora que havia sido realizada sobre o semirreboque - carreta - que pertencia a um caminhoneiro, por se entender que o semirreboque era útil ao exercício da profissão.  

sábado, 4 de outubro de 2014

A imprensa e a exposição de acusados


     Prezado leitor, propomos que você faça o seguinte exercício: por um momento imagine a si mesmo no lugar do sujeito que, inocente, é acusado da prática de um crime e tem o seu rosto exposto para milhões de pessoas, não podendo mais sair na rua devido à possibilidade de ser linchado. 

        Então, caso você esteja respondendo a um processo criminal em liberdade, você não pode mais estudar, trabalhar, namorar ou simplesmente passear pela rua da tua cidade porque um diretor de um programa jornalístico precisava aumentar seus índices de audiência. Terrível isso, não é?

      Antigamente era comum nos jornais e revistas afirmações do tipo: "este homem matou X pessoas" junto à foto da pessoa acusada. Porém em alguns desses casos o acusado acabou demonstrando sua inocência no curso do processo e, por conta disso, vários jornais, revistas e emissoras de televisão foram condenados a pagar vultosas indenizações. 

        Esses prejuízos fizeram com que a linguagem utilizada pelo jornalismo responsável se alterasse para frases do tipo: "este homem é acusado de ter matado X pessoas". A distância entre dizer que Pedro matou Paulo e dizer que Pedro é acusado de ter matado Paulo é enorme e faz toda a diferença na hipótese de um processo contra o órgão de imprensa que expôs os fatos. 

       Só que infelizmente ainda há alguns órgãos de imprensa que, ávidos pela audiência, jogam a prudência às favas e não se importam com a possibilidade de que o acusado seja inocente. Após fazerem alguns cálculos - 'tal percentual de audiência vai aumentar o faturamento com anúncios em tantos milhões e então não importa que um ou outro réu nos processe e eventualmente até ganhe a ação, pois nós estaremos no lucro'. 'Basta que paguemos o departamento jurídico em dia e então podemos distribuir acusações a rodo' -. 

        Ora, exigir mais prudência na divulgação de acusados em inquéritos policiais ou ações criminais não é proteger bandidos, é deixar que a Polícia e a Justiça busquem a veracidade dos fatos sem a paixão que a pressão da exposição pública provoca.  

       O caminho entre alguém ser acusado da prática de um crime e ser considerado culpado por esse crime é longo. Vejamos: quando ocorre um fato criminoso e alguém é suspeito da autoria, a Polícia passa a investigar o cidadão, que, nesta fase, é chamado de investigado. Se entender que há elementos para o indiciamento - prova da materialidade e indícios de autoria -, o delegado indicia o sujeito, que passa a ser chamado de indiciado. O inquérito policial então vai para o Ministério Público, que o examina e, se entender que for o caso, faz a denúncia, o que transforma o indiciado em denunciado. O juiz, então, se entender que há elementos suficientes para instaurar um processo, recebe a denúncia, e a partir daí o sujeito passa a ser chamado de réu.

        A dúvida que pode surgir é: o fato de alguém ser réu em um processo criminal significa que ele é necessariamente culpado? Bem, a respeito desse assunto, o artigo 5º, inciso LVII dar Constituição Federal diz que 'ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória'. Ou seja: a Constituição dispõe que, até que haja uma sentença penal condenando o réu da qual já não caiba mais nenhum recurso, presume-se que o réu é inocente.

       Concluindo, o que o jornalismo irresponsável - felizmente minoritário - faz com a honra e a imagem dos acusados é monstruoso - especialmente pelo fato de que alguns dos acusados são inocentes -. O cidadão de bem vê os índices de criminalidade do País crescendo exponencialmente, então assiste a esses programas sensacionalistas e vê meliantes debochando da Polícia e da Justiça, o que o faz sentir um misto de desespero e impotência. Passa então a desejar um sistema judicial que condene o réu sem dar a ele o direito de se defender - o que só seria possível numa ditadura -. Mas será que se o acusado fosse ele não iria, então, preferir ter o direito a um julgamento justo? É essa indagação que propomos para a reflexão do leitor.  

Veja também: Bem impenhoravel: vai a leilão ou não?




quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Advogado do diabo: de onde vem essa expressão?


            Nos processos de canonização havia um membro da Cúria Romana responsável por apontar falhas no processo, indícios de falsidade dos milagres atribuídos ao candidato a santo, etc. Esse membro da Cúria recebeu a alcunha de advogado do diabo. 

             A expressão é usada para designar, em uma conversa, aquela pessoa que sempre está disposta a contrariar a tudo e a todos.

Veja também: a imprensa e a exposição de acusados

sábado, 27 de setembro de 2014

Diferença entre RPV e precatórios

Atenção: antes de ler o texto abaixo, saiba mais sobre precatórios clicando aqui, aqui e aqui.



           Recentemente compartilhamos na linha do tempo da nossa página no Facebook a seguinte notícia: dívida pública com vários autores de processo pode ser paga em RPV

     Alguns leitores nos contataram em privado perguntando sobre o significado de algumas expressões usadas na reportagem (litisconsórcio ativo facultativo, precatórios e requisição de pequeno valor). Decidimos então escrever este post, afinal, a página é destinada justamente a quem não é da área jurídica. 

           Vamos abordar os assuntos por partes:

1 - Litisconsórcio ativo facultativo


           Ocorre litisconsórcio quando há mais de um autor - litisconsórcio ativo - e/ou mais de um réu - litisconsórcio passivo - no mesmo processo.

           Exemplos: 

a) Litisconsórcio ativo: João tem um crédito contra Paulo e vem a falecer. Então todos os herdeiros de João - Mateus, Marcos e Lucas - ajuízam uma ação contra Paulo visando a cobrança dos valores que este (Paulo) devia ao de cujus (João).

b) Litisconsórcio passivo: João está em débito com um banco e vem a falecer. Como os herdeiros respondem pela dívida do falecido até o limite das forças da herança, o banco ajuíza uma ação de cobrança contra todos os herdeiros do devedor - na hipótese, Mateus, Marcos e Lucas -.  

        Se o litisconsórcio decorre da lei - como nos exemplos acima -, se trata de um litisconsórcio necessário. Já nos casos em que a lei permite que haja uma ação separada para cada parte e as pessoas optam por litigar em conjunto, se trata de um litisconsórcio facultativo. Normalmente são os advogados que tomam a decisão de reunir várias pessoas no polo ativo ou no polo passivo de uma ação e o fazem por economia de material/trabalho. 

Exemplificando: o advogado Pandolfo, conhecido por mover ações contra empresas de telefonia, recebe, em um breve espaço de tempo, procurações de 100 clientes que foram prejudicados pela empresa Sinalruim. Então, ao invés de ajuizar 100 ações com um cliente em cada, ele ajuiza 10 ações com 10 clientes em cada uma. Assim, quando ele tiver que fazer petições, por exemplo, ele terá que fazer 10 petições ao invés de 100. E como se trata de ações movidas contra a mesma empresa, isso é juridicamente possível.

2 - Precatórios


            Em um post anterior, escrevemos sobre os precatórios o seguinte: 

Os precatórios judiciais são a forma da Fazenda Pública pagar as dívidas que possui em decorrência da perda de ações judiciais. O procedimento para se executar um crédito contra o Estado – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – é diferente do procedimento utilizado para se executar um crédito contra uma pessoa física ou contra uma empresa.

Quando uma pessoa física ou uma empresa perde uma ação judicial e essa ação vai para a fase executiva – fase de cobrança -, são os bens da pessoa que respondem pelo débito. Ou seja: o juiz, a pedido do exequente/credor, determina que o Oficial de Justiça penhore bens do devedor. A seguir, os bens são leiloados e, do dinheiro arrecadado com o leilão, pagam-se o débito, as custas judiciais e os honorários devidos ao advogado do exeqüente – chamados honorários sucumbenciais -. Caso sobre algum valor após serem pagos todos esses encargos, o que sobra é devolvido ao devedor.

Só que quando o Estado perde uma ação judicial e esta, depois de esgotados todos os recursos, vai para a fase de cobrança, há um obstáculo: os bens públicos não são passíveis de penhora. E então, como é que se faz para que o credor receba o que lhe é devido? Nesse caso, o juiz, a pedido do exequente, manda o Escrivão do cartório da vara onde atua enviar um ofício ao Tribunal, requerendo a expedição de um precatório judicial em favor do credor. Lá na Secretaria de Precatórios, esse pedido entra em uma fila em ordem cronológica e fica esperando a sua vez de ser pago.

A Fazenda Pública não paga os precatórios com a celeridade que deveria. De fato, por lei, os precatórios inscritos no orçamento até a metade de 2014 – por exemplo – deveriam ser pagos até o fim de 2015. Mas não é isso o que acontece na prática. Há precatórios que levam décadas para serem pagos

Isso ocorre porque esses pagamentos dependem do valor destinado a eles na lei orçamentária e, para os administradores públicos, fazer asfalto de baixa qualidade dá mais voto do que pagar precatórios. Por conta dessa demora, criou-se um mercado de compra e venda de precatórios, que mencionamos nos posts indicados acima da foto do início deste post. 

3 - Requisição de Pequeno Valor


        Se alguém é credor do Estado até um certo limite, poderá requisitar que se faça a execução contra a Fazenda Pública mediante requisição de pequeno valor - RPV -. A requisição de pequeno valor evita a expedição de precatório e normalmente é paga em poucos meses, evitando que o credor tenha que esperar anos e anos pelo pagamento de um precatório

         É importante observar que, se alguém tiver um crédito de valor superior ao limite da RPV, ele poderá renunciar a parcela do crédito que passa desse limite para requerer a expedição de uma requisição de pequeno valor e receber seu crédito - ou a parte que sobrou após a renúncia - de forma mais rápida.  

           Os limites para que seja possível requisitar a RPV são os seguintes:

a) Até 60 salários mínimos, se o crédito for contra a Fazenda Pública federal;
b) Até 40 salários mínimos¹, se o crédito for contra a Fazenda Pública estadual;
c) Até 30 salários mínimos², se o crédito for contra a Fazenda Pública municipal.

        Para concluir, e retomando a notícia do Conjur mencionada no início do post, o que o STF decidiu é que, se em uma ação contra a Fazenda Pública há mais de um autor em litisconsórcio facultativo e o crédito de cada um deles é inferior ao limite da RPV, o pagamento não precisa ser feito por precatório, podendo ser feito por RPV. 

¹ - Esse limite só é válido se não houver lei estadual estabelecendo outro valor.
² - Esse limite só é válido se não houver lei municipal estabelecendo outro valor.




sábado, 20 de setembro de 2014

Assédio Sexual



           A sexualidade faz parte da natureza humana. Porém, para que o ato sexual seja lícito, ambas as partes envolvidas devem ter o poder de decidir se querem fazer sexo, quando, onde, como e com quem, ou seja: nada pode interferir na liberdade de uma pessoa recusar as investidas sexuais de outra, pois. se essa liberdade for restringida, tem-se, em tese, um ato criminoso. 

        Neste post vamos nos ater ao crime de assédio, em que a conduta do autor, apesar de não ser tão violenta quanto no estupro, restringe - ou procura restringir - a liberdade da vítima. Só pode haver assédio sexual se o autor do crime tem, por exercer um determinado cargo em empresa - ou ONG ou instituição religiosa -, uma certa dose de poder sobre a vítima

        O autor, então, constrange a vítima  a lhe conceder favores sexuais utilizando sua superioridade hierárquica. Ou seja: se a vítima resistir, o autor pode fazer uso de seu poder para se vingar, anulando ou reduzindo a liberdade da vítima de dizer não. Por exemplo: "saia comigo ou eu te demito". O autor também comete crime de assédio se prometer benefícios à vítima. Exemplificando: "saia comigo e ganharás um aumento/promoção". 

      É importante observar que, quando ambas as partes exercem o mesmo cargo ou função na empresa não há crime de assédio pois não há, nesse caso, ascendência hierárquica entre o (a) assediador (a) e o (a) assediado (a). 

           Em uma empresa, ONG ou órgão público, caso ocorra um crime dessa espécie, pode-se ajuizar uma ação de indenização por dano moral contra o autor e contra a empresa, A responsabilidade da empresa consiste no fato de que a mesma responde objetivamente pelos atos ilícitos de seus funcionários. 

           Em resumo: para que se configure o crime de assédio sexual, é necessário que o autor do crime tenha superioridade hierárquica em relação à vítima e a constranja, prometendo beneficiá-la caso ela lhe conceda favores sexuais ou ameaçando prejudicá-la no caso de ela não ceder. Não é preciso que a vítima ceda à pressão do autor: basta que haja o constrangimento.



sábado, 13 de setembro de 2014

Salvados são isentos de ICMS



        De acordo com a Súmula Vinculante n.º 32 do STF, "não incide ICMS sobre a alienação de salvados de sinistro pelas seguradoras". O que nos leva a duas questões: o que são sinistros e o que são salvados?
           Sinistros são atos ou fatos danosos que ocorrem aos bens segurados. Caso o sinistro ocorrido esteja coberto por um seguro, a seguradora terá a obrigação de pagar a indenização devida ao segurado de acordo com os parâmetros indenizatórios constantes da apólice. 
       E quanto aos bens que ficaram intactos apesar do sinistro - como a parte da carga de um caminhão tombado que não se danificou com o acidente -? Ora, esses bens, denominados salvados, são recolhidos pela seguradora e vendidos em leilão.
       Através da Súmula Vinculante n.º 32, o STF consolidou o entendimento de que o arrematante das mercadorias vendidas por uma seguradora em leilão é isento do ICMS incidente sobre os produtos arrematados, desde que tais produtos sejam salvados de sinistros,
           Se você gostou deste post, deixe o seu comentário.
Veja também: 
Assédio sexual
Decifrando o Direito