Introdução
Primeiramente é necessário conceituar pessoa jurídica para posteriormente fazer o debate sobre os requisitos da desconsideração. De acordo com o dicionário Houaiss, pessoa jurídica é uma 'entidade ou associação legalmente reconhecida e autorizada a funcionar', ou seja, um sujeito de direitos e obrigações a quem a lei concedeu personalidade jurídica.
A personalidade jurídica, então, é a entidade apta para adquirir direitos e deveres na ordem civil.
A pessoa jurídica é criada para que os seus fundadores, a princípio, não respondam com seus bens pessoais pelas obrigações sociais. Isto quer dizer que, via de regra, os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, uma vez que esta possui personalidade distinta da de seus membros.
Requisitos para a desconsideração da personalidade civil da pessoa jurídica no Código Civil
Visto que a pessoa jurídica é constituída para adquirir direitos e obrigações, e que seu patrimônio responderá pelas obrigações sociais, há, apesar disso, algumas hipóteses em que é possível a extensão das obrigações assumidas pela pessoa jurídica aos bens particulares dos administradores ou dos sócios por meio da desconsideração da personalidade jurídica.
Então, em se tratando de uma questão cível, adota-se a teoria maior, nos termos do artigo 50 do CC, para que haja a desconsideração da personalidade jurídica deve haver abuso da personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial:
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
É pacífico na doutrina o entendimento de que, em relação às obrigações cíveis, há a necessidade de ter havido abuso da personalidade por meio de fraude para que seja permitida a desconsideração da personalidade.
Nesse sentido, o Enunciado 146 da II Jornada de Direito Civil do CNJ3 estabelece que "nas relações civis, interpretam-se restritivamente os parâmetros de desconsideração da personalidade jurídica previstos no art. 50".
A jurisprudência do STJ firmou o entendimento de que a desconsideração da personalidade jurídica prevista no artigo 50 do CC se trata de regra de exceção, ou seja, de restrição ao princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica. Assim, a interpretação que melhor se coaduna com esse dispositivo legal é a que relega sua aplicação a casos extremos, em que a pessoa jurídica tenha sido instrumento para fins fraudulentos, configurado mediante o desvio da finalidade institucional ou a confusão patrimonial.
Requisitos para a desconsideração da pessoa jurídica no CDC
Os requisitos civilistas de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, nos termos da teoria maior, não se aplicam na relação de consumo, pois referido ramo do direito possui regramento específico.
Destarte, havendo relação de consumo para que haja a desconsideração da personalidade jurídica basta existir abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social, outras hipóteses são a ocorrência da falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração, com fulcro no art. 28, CDC:
Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
Percebe-se que os requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica em causas que envolvam relação de consumo são abrangentes, não há necessidade de fraude.
Outrossim pode ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores, de acordo com o art. 28, § 5º, do CDC, que incorpora a teoria menor.
Ou seja, existindo relação de consumo incide a teoria menor prevista no § 5.º do art. 28 do CDC, que dispensa a comprovação de desvio de finalidade e da confusão patrimonial, bastando que a personalidade da pessoa jurídica caracterize obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados ao consumidor.