Lei Simplificada

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Você abandonaria o seu filho?


        Usamos o título provocativo acima para falar de um instituto do direito romano que hoje deixaria a esmagadora maioria das pessoas chocada: o jus exponendi. Em síntese, o jus exponendi consistia no seguinte: se a esposa de um homem tivesse um filho com alguma deficiência física, o pai podia levar a criança até o mato - ou até a beira de um rio - e deixá-la lá exposta para ser possivelmente devorada por animais selvagens.

        Esse era um costume da Roma pré cristã, pois a partir da adoção do Cristianismo como religião oficial, essa prática foi sendo gradativamente abandonada. Surgiram os hospitais, orfanatos, asilos e leprosários e os novos valores - solidariedade, compaixão e apoio material aos necessitados - fizeram com que o jus exponendi fosse, então, considerado bárbaro e desumano.

       É evidente que nós não podemos, vivendo na realidade atual, fazer juízo de valor a respeito de um costume de uma época em que a aptidão para ser um soldado era requisito básico para qualquer um que desejasse adquirir o status de cidadão romano. 


        Outra razão para a existência desse direito era a convicção - existente entre muitos povos antigos - de que não faz nenhum sentido criar uma pessoa que vai ser dependente de outras pessoas pela vida inteira. Hoje em dia é perfeitamente possível que um paraplégico estude e exerça uma profissão intelectual, mas na Antiguidade ter um corpo saudável era essencial. 

      Alguns povos indígenas têm costume semelhante, mas com algumas diferenças: normalmente adota-se a medida devido à crença de que a criança é amaldiçoada. Uma outra diferença é que a criança é enterrada ainda viva, como se pode ver no vídeo abaixo:





      Vamos mencionar um dos motivos que justificam - segundo a ótica dos índios - o enterro de crianças vivas: se nasce um casal de gêmeos em uma tribo, por exemplo, os índios acreditam que um deles é do bem e o outro é do mal. Como não é possível definir qual é o do bem e qual é o do mal, enterram-se ambos. 

       Embora seja natural, para quem tem uma formação cultural ocidental, ver esses costumes como bizarros, os antropólogos dizem que as autoridades não podem se intrometer, porque essa prática faz parte da cultura desse povos. Interferir de qualquer forma seria uma agressão a tais culturas e isso, inclusive, é vedado pela Constituição. 


sábado, 16 de maio de 2015

A loja pode pegar o produto de volta se eu não pagar?





     Pergunta enviada por uma leitora do blog: "comprei uma geladeira há alguns meses e, por estar desempregada, estou inadimplente com as parcelas". "Ligaram da loja dizendo que, se eu não pagar as parcelas em atraso, vão vir na minha casa pegar a geladeira de volta". "Eles podem fazer isso"?

      Bem, a resposta é sim, pelo seguinte motivo: quando alguém compra alguma mercadoria a crédito, normalmente é feito um contrato estabelecendo a chamada alienação fiduciária em garantia em favor do credor. Na alienação fiduciária em garantia, o devedor transfere a propriedade resolúvel e a posse indireta de um bem infungível ¹(CC, art. 1.361) ou de um bem imóvel (Lei 9.514/97, arts. 22 a 33) ao credor como garantia de seu débito, resolvendo-se o direito do adquirente com o adimplemento da obrigação - ou seja: com o pagamento da dívida garantida -.

   Trocando em miúdos: ao contratar a alienação fiduciária, o devedor-fiduciante transmite a propriedade ao credor-fiduciário e, por esse meio, abre mão do seu direito de propriedade. Em razão desse contrato. é criada, em favor do credor-fiduciário, uma propriedade resolúvel (condicional) e, por conta disso, o devedor-fiduciante é investido na qualidade de proprietário sob condição suspensiva, e pode obter a propriedade plena novamente ao pagar a dívida

      E porque é feito dessa maneira? Simples: se não houvesse a alienação fiduciária em garantia, as pessoas só poderiam comprar à vista e a economia ficaria em um estado de estagnação permanente, porque as lojas correriam um risco excessivo se vendessem a crédito. Exemplificando: se o devedor, ao adquirir bens e mercadorias a crédito, obtivesse a propriedade plena desses bens, ele poderia vender esses bens a terceiros e o credor teria que ajuizar uma ação de cobrança excessivamente demorada, custosa e arriscada para tentar obter o pagamento.
     Já com a alienação fiduciária em garantia, o credor pode retomar o bem sem maiores complicações, afinal, no ato da compra, o devedor lhe transferiu a propriedade do mesmo. Só é necessário recorrer ao Judiciário nos casos que envolvem imóveis ou veículos. 

¹ - Bem infungível: bem que não pode ser substituído por outro da mesma espécie, qualidade e quantidade.  


sexta-feira, 8 de maio de 2015

Demissão: quais são os direitos do trabalhador


        É importante saber quais são os direitos do trabalhador quando termina o contrato de trabalho. A demissão pode ocorrer a pedido do trabalhador, ou por iniciativa do empregador, com ou sem justa causa. E, em cada uma destas situações, o trabalhador terá determinados direitos - que vão variar conforme a hipótese -. 
Direitos do trabalhador ao se desligar do emprego

        Há várias maneiras de se encerrar um contrato de trabalho e uma delas é a demissão. A demissão pode ocorrer por iniciativa do empregado (a pedido), ou por iniciativa do empregador. Nesta última hipótese, ela pode acontecer por justa causa, ou seja, quando o empregador tem um motivo previsto em lei para efetuar o desligamento do funcionário; ou sem justa causa, quando o motivo não está previsto em lei.

1 - Direitos do trabalhador que pede demissão: 

- saldo de salários, ou seja, os dias que trabalhou e que tem a receber;
- décimo terceiro salário proporcional aos meses que trabalhou;
- férias proporcionais aos meses que trabalhou;
- 1/3 de férias calculado sobre o valor das férias proporcionais;
- aviso prévio, caso ele trabalhe o mês do aviso. O empregado deverá avisar seu empregador com antecedência mínima de 30 dias. Ele não precisa trabalhar estes 30 dias, mas, se optar por não trabalhar, poderá ter seu salário descontado.

      É importante ressaltar que. ao pedir demissão. o trabalhador perde o direito de sacar seu FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). Os valores depositados na conta vinculada do trabalhador continuam rendendo juros e correção monetária, mas só poderão ser sacados quando sua situação se enquadrar às regras do fundo. 

2.1 - Demissão sem justa causa

        Se o trabalhador for demitido sem justa causa, ele terá direito às seguintes verbas rescisórias:

- saldo de salários;
- aviso prévio no valor de sua última remuneração;
- décimo terceiro salário proporcional;
- férias proporcionais;
- 1/3 de férias;
- saque do FGTS depositado na Caixa Econômica Federal;
- Indenização de 40%, calculada sobre o total dos depósitos realizados na conta do FGTS durante o contrato de trabalho, devidamente corrigido, inclusive sobre os depósitos sacados durante a vigência do contrato;
- seguro desemprego, se o funcionário tiver trabalhado por, no mínimo,  seis meses.

       Ao ser demitido sem justa causa, o empregador deverá avisar o trabalhador com, no mínimo, 30 dias de antecedência. É o chamado aviso prévio. Ao conceder esse aviso, o empregador poderá indeniza-lo, não exigindo que o trabalhador cumpra o serviço nestes dias. Caso queira que o trabalhador cumpra o serviço neste período, o empregado pode optar por reduzir em duas horas sua jornada de trabalho diária ou ficar os últimos sete dias corridos sem trabalhar. O aviso prévio tem por finalidade garantir ao empregado a possibilidade de procurar um novo emprego.

2.2 - Demissão por justa causa

       É considerada justa causa para demissão quando o empregado comete algum ato faltoso que faz desaparecer a confiança e a boa-fé entre as partes, tornando necessário o encerramento da relação empregatícia.

     Estes atos faltosos que justificam a demissão por justa causa podem se referir às obrigações contratuais ou à conduta pessoal do empregado e estão previstos no artigo 482 da CLT. Neste caso, o empregador não pode demitir sem especificar a falta cometida.

       Na demissão por justa causa, o empregado deve receber o saldo de salário e as férias vencidas com acréscimo de 1/3 referente ao abono constitucional caso tenha mais de um ano de empresa. Perde, portanto, o direito ao saque do FGTS e ao décimo terceiro salário proporcional.

Veja também:

http://leisimplificada.blogspot.com.br/2015/05/a-loja-pode-pegar-o-produto-de-volta-se.html


sábado, 25 de abril de 2015

As inovações tecnológicas e o Direito

Atenção: este post é uma proposta de reflexão.






       

Introdução  


         O Direito evolui de uma forma mais lenta que o restante da sociedade, ou seja: primeiro ocorre uma mudança social e depois os juristas buscam adequar o ordenamento jurídico à nova realidade. Tem sido assim pelo menos desde que Gutenberg criou a imprensa com tipos móveis - o que exigiu novas leis para proteger os direitos autorais -, e Jacquard criou o tear mecânico - que criou a indústria têxtil e demandou novas leis trabalhistas -.

       Neste exato momento, existem tecnologias - algumas já disponíveis no mercado e outras em desenvolvimento - que vão exigir dos juristas uma significativa atualização da doutrina, da legislação e da jurisprudência. Alguns exemplos:

1 - Impressora 3D

       
       Com uma impressora 3D é possível fabricar, a um custo reduzido, inúmeros produtos que só indústrias de grande porte poderiam fabricar. Deixando de lado as previsíveis mudanças que a popularização dessas impressoras poderia trazer para o mercado de trabalho, há que se observar o seguinte: essas máquinas tornam possível que qualquer um fabrique armas de plástico com poder de fogo.

2 - Drones


         Desenvolvidos inicialmente para finalidades militares - para missões de espionagem e bombardeio sem pôr em risco a vida de pilotos -, os drones agora começam a ter suas versões civis. Há, disponíveis no mercado, pequenas máquinas voadoras capazes de prestar serviços - especialmente na entrega de mercadorias -. Há que se pensar na seguinte possibilidade - não tão remota assim -: e se um grupo terrorista comprar milhares dessas máquinas para 'entregar' bombas de explosivo plástico nos seus alvos?


3 - Carros sem motorista


           Várias montadoras tem protótipos de carros que irão de um lugar a outro sem precisar ter alguém ao volante. O problema é definir a responsabilidade: em caso de acidente, quem vai indenizar a vítima, a fábrica ou o dono do carro?


4 - Robôs com inteligência artificial


          
          A possibilidade de um mundo - que poderá existir em 30 ou 40 anos - em que robôs muito mais fortes e inteligentes que os seres humanos façam todo tipo de trabalho - não só braçais como também intelectuais e artísticos -, e tornem os seres humanos dispensáveis traz o seguinte dilema: e se essas máquinas, dotadas de inteligência artificial, chegarem à conclusão de que o planeta ficará melhor sem nós? A robótica já projetou protótipos de robôs capazes de aprender, tomar decisões de maneira lógica e até... expressar emoções...

           Sim, e se houver fábricas de toda a espécie de mercadoria com operários robôs - inclusive fábricas de robôs projetadas e controladas por androides -, o que é que vai impedir essas máquinas de decidirem - como nos filmes de ficção científica - nos exterminar ou escravizar?

         Talvez os futurólogos estejam errados e esses temores não tenham o menor fundamento, mas a doutrina tem que começar logo a discutir sobre a possibilidade de se criar... leis aplicáveis a robôs. Isso traria, só pra começar, uma enorme discussão sobre a personalidade civil: uma máquina pode ou não pode ser sujeito de direitos e deveres? No momento em que se atribuir personalidade civil a UM robô, essa regra também vai se aplicar aos demais? Todos os robôs existentes ganharão, por assim dizer, alforria? Possuir robôs será considerado crime, tal como possuir escravos? Nesse caso, quem vai indenizar os proprietários?

Conclusão


         A atual geração de juristas terá, em um prazo não muito distante, dilemas filosóficos e jurídicos criados pela inovação tecnológica. Evidentemente a humanidade não vai renunciar a inovação e seria um absurdo se assim o fizesse. O que se deve fazer é pensar em como fazer uma grande reformulação do ordenamento jurídico para adequá-lo a essa nova realidade. Esse é o grande desafio para os juristas do presente século.

sábado, 11 de abril de 2015

Legítima defesa putativa

Atenção: o texto abaixo segue a linha editorial do blog, que é direcionado para quem NÃO é da área jurídica.



          É de conhecimento geral que o crime cometido em legítima defesa NÃO é crime, por lhe faltar o elemento da tipicidade. Mas então o que acontece na situação em que o agente comete o ato pensando estar em uma situação de legítima defesa quando na verdade não está? 

        Exemplificando: vamos supor que Caio, ao caminhar à noite por uma rua mal iluminada, vê logo adiante, vindo em sua direção, seu desafeto Tício. Tício, que ainda não viu Caio, leva a mão ao bolso para pegar o celular e isso faz com que Caio pense que ele vai sacar uma arma. Caio então saca um revólver que tem na cintura e atira, matando Tício. 

           Bem, Caio imaginou estar em uma situação de legítima defesa quando a situação real era bem diversa daquela imaginada. Porém, por força do art. 20, § 1º do Código Penal, ele ficará isento de pena:  "É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo".

       O tratamento que o ordenamento jurídico brasileiro dispensa à legítima defesa real é diferente do tratamento dispensado à legítima defesa putativa: no caso da legítima defesa real não há crime, e, no caso da legítima defesa putativa, o agente fica isento de pena.



sexta-feira, 3 de abril de 2015

A promessa de compra e venda


Introdução

        
         Todos os anos, milhares de imóveis são vendidos no Brasil. Em muitos casos, antes do contrato de compra e venda - ou seja: da passagem da escritura -, há um contrato de promessa de compra e venda. Isso ocorre especialmente nos casos em que o comprador paga uma parte ou todo o valor do imóvel de forma parcelada - ou seja: a crédito -.

         Essa espécie de contrato é conveniente para ambos os lados: para o vendedor, é uma garantia de que não vai tomar um calote ao vender o imóvel e, para o comprador, torna possível a aquisição do imóvel desejado, ao facilitar o pagamento. 

Do crescimento das cidades brasileiras


       As cidades brasileiras tiveram um grande crescimento, principalmente a partir dos anos 30 do século XX, criando em alguns lugares grandes aglomerações urbanas. Essa crescimento urbano ocorreu especialmente por conta do êxodo rural. Muitos investidores se aproveitaram desse contexto para fazer a chamada especulação imobiliária.

        Um fato que ocorria com frequência, antes do advento do Decreto-lei 58/37, era o seguinte: um investidor comprava uma área na periferia de uma cidade em crescimento, dividia essa área em lotes e então vendia os lotes mediante contrato de promessa de compra e venda. Passados alguns anos, muitos dos promitentes compradores construíam casas no local e então os terrenos vazios - não edificados - tinham o seu valor aumentado exponencialmente.

      Diante disso, o que é que alguns investidores faziam? Na hora de fazer a escritura de transferência do terreno para o adquirente, eles desfaziam o negócio, indenizavam o promitente comprador - devolvendo o valor do contrato em dobro - e então vendiam o imóvel novamente para outra pessoa por um valor 3, 4 ou 5 vezes superior ao valor da primeira venda.

A solução legal


       Para moralizar essa situação, o Decreto-lei 58/37 passou a reconhecer o direito do promitente comprador de imóveis loteados como um direito real - e esse direito foi incluído no rol dos direitos do Código Civil de 2002 -.

        E qual é o efeito do contrato de promessa de compra e venda? Bem, se os requisitos estiverem devidamente atendidos, o promitente comprador pode exigir que o promitente vendedor faça a escritura de compra e venda transferindo o bem para si. Mas e se o promitente vendedor não fizer isso voluntariamente? Então o promitente comprador pode pedir ao juiz que profira uma sentença determinando a adjudicação compulsória, ou seja: a sentença servirá como título para a transferência do domínio.

        Mas para que o contrato de promessa de compra e venda tenha eficácia, o instrumento contratual - o documento - tem que estar registrado no cartório de registro de imóveis. Os juristas ainda não chegaram a um consenso sobre se o documento, para ter eficácia, deve ser público - ou seja: lavrado no tabelionato - ou se pode ser por instrumento particular.

       Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza entende que vigora, na espécie, a regra do art. 108 do Código Civil, ou seja: "Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País".

       Ou seja: até 30 salários mínimos, a promessa de compra e venda pode ser feita por contrato particular. Acima desse limite, deve ser por instrumento público. Há exceções a essa regra na legislação extravagante¹, mas não vamos descrevê-las em detalhe porque essa página se destina a quem NÃO é da área jurídica e não queremos alongar muito o texto.

Conclusão


        Então, para que o promitente comprador tenha direito à adjudicação compulsória, ele deve ter em mãos um contrato de promessa de compra e venda sem a possibilidade de arrependimento. Esse contrato deve ser por instrumento público - a menos que o valor do negócio seja de menos de 30 salários mínimos - e deve estar registrado no cartório de registro de imóveis.

         Com essa documentação e mais os comprovantes de pagamento, o promitente comprador pode pedir ao juiz - se o promitente vendedor não quiser fazer a transferência do bem voluntariamente - uma sentença que ordene a expedição de carta de adjudicação para registro na matrícula do imóvel e, com isso, transferir a titularidade do bem no cartório.


¹ - Art. 11 do Decreto-lei 58/37, o art. 26 da lei 6.766, o § 5º do art. 61 da lei 4.380 e o art. 38 da lei 9.514.


sábado, 28 de março de 2015

O bebê natimorto: nasceu com vida ou não?


         O Código Civil brasileiro dispõe que a personalidade civil começa do nascimento com vida, e dispõe também  que a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Mas o que é que se faz quando não se tem certeza se um bebê nasceu com vida ou não? Qual é a importância de se definir tal circunstância?

          Bem, para ilustrar melhor esse assunto, vamos imaginar o seguinte: João casa com Maria  pelo regime da comunhão parcial de bens, e, na constância do matrimônio, o casal adquire alguns bens (imóveis, veículos, aplicações). Então Maria fica grávida e, no 6º mês de gestação, João vem a falecer.

         Por ocasião do nascimento do bebê, o mesmo morre e surge a dúvida: ele já nasceu morto ou nasceu vivo e faleceu logo em seguida? A perícia então recebe a incumbência de responder a esse questionamento, que tem consequências jurídicas. Normalmente se examinam os pulmões do feto para ver se o mesmo respirou após o nascimento. Se há ar dentro dos pulmões, então o feto respirou e, portanto, nasceu com vida. Se não há ar dentro dos pulmões o feto é chamado de natimorto.

          Se o feto nasceu morto, ele não adquiriu a personalidade civil e não herdará o patrimônio de seu pai João, que faleceu no 6º mês de gestação. Já se o feto nasceu vivo e depois morreu, ele adquiriu a personalidade civil e entrou na herança do patrimônio deixado pelo pai. No caso do bebê ser um natimorto, os parentes do pai entram como herdeiros no inventário. Já se o bebê nasceu vivo e depois morreu, o patrimônio vai ficar todo para a mãe, Maria.

         No caso do bebê nascer vivo e morrer logo após o nascimento, Maria vai ficar com tudo porque: 50% do patrimônio já é dela em razão do regime de bens (a chamada legítima). E quanto aos demais 50%? Bem, se o feto tivesse nascido morto, João teria morrido sem filhos e então seus familiares ficariam com a metade (25% do total) e a outra metade ficaria para Maria.

         Mas como na hipótese a perícia constatou que o bebê nasceu vivo e morreu logo após o parto, a parte que o bebê herdaria (25% do total) ficará para a sua mãe, Maria.