Lei Simplificada

sábado, 7 de fevereiro de 2015

Registro Torrens: proteção jurídica eficaz para a propriedade rural


Introdução

       
      Quem possui imóveis rurais de alto valor no Brasil vive angustiado com a possibilidade de sua propriedade ser invadida. O que a maioria desses investidores ignora é que existe um meio de se obter uma presunção absoluta da propriedade - superior, portanto, à presunção relativa obtida com o mero registro da escritura -. Para saber mais sobre presunção absoluta ou relativa, clique aqui.

O Sistema de Registro Torrens


       O sistema de registro Torrens é regulado pelos artigos 277 a 288 da lei 6.015/73 (íntegra do texto aqui). Uma vez que uma sentença defira o registro Torrens para um imóvel rural, o proprietário passa a ter a presunção absoluta de propriedade. Isso significa que, enquanto o proprietário não vender o bem e estiver vivo, será considerado dono do respectivo imóvel, sem a possibilidade de prova em contrário.

Como agir em caso de esbulho


       Como consequência dessa presunção absoluta de propriedade, em caso de esbulho (invasão), o dono do imóvel pode pedir à polícia que expulse os invasores imediatamente, pois para se proteger um imóvel rural registrado pelo sistema de registro Torrens não há necessidade de uma ordem judicial. Mas e se o comandante do destacamento policial se recusar a expulsar os invasores? Nesse caso, o proprietário deve notificá-lo através do Tabelionato de Registro de Títulos e Documentos - mais detalhes sobre notificação extrajudicial aqui -, fixando prazo para atendimento do pedido. 

         Essa notificação tem por objetivo provar que o proprietário reportou o fato esbulho à autoridade policial pedindo providências e não foi atendido. Deve-se deixar claro na carta que, se os invasores causarem qualquer espécie de prejuízo após o fim do prazo estipulado, será ajuizada uma ação indenizatória contra o Estado para cobrar os prejuízos. E ainda: se o Estado for condenado a pagar os prejuízos, provavelmente processará o comandante para obter o ressarcimento da indenização paga.

Responsabilidade pelos prejuízos causados pelos invasores


        Se o comandante não expulsar os invasores mesmo após essa notificação, o dono do imóvel deve tomar as medidas judiciais de praxe - ação reivindicatória ou ação de reintegração de posse -, juntar todos os recibos das despesas efetuadas e ajuizar uma ação indenizatória contra o Estado afinal este deveria  ter protegido a sua propriedade e não o fez.       

         Esse tipo de registro não pode ser feito em qualquer propriedade - há uma série de requisitos que se deve atender para o deferimento -, é complexo - ou seja: exige a assistência de um advogado - e caro, mas é a melhor forma de se obter proteção estatal para a propriedade rural.

Requisitos para submeter um imóvel rural ao Sistema Torrens


          Para que um imóvel rural seja registrado pelo sistema de registro Torrens, é preciso que o dono possua um título aquisitivo (p. ex.: escritura de compra e venda) registrado no Cartório de Registro de Imóveis onde o bem está localizado. É preciso que não exista qualquer espécie de contestação ao direito de propriedade (por exemplo: ações pedindo a anulação do contrato anterior, que transferiu a propriedade para o dono atual). Também não se pode registrar um imóvel pelo sistema Torrens se houver algum litígio com vizinhos por conta de divisa.

Procedimento


        Reunidos os documentos necessários, o dono da propriedade os leva ao oficial do Cartório de Registro de Imóveis e pede que o bem seja submetido ao sistema de registro Torrens. O oficial do registro, após conferir se os documentos estão em ordem, os remete para o juiz para apreciação. As custas judiciais, os emolumentos do registro e os honorários do advogado que representa o proprietário serão custeados por este.

Conclusão


         Diante do alto risco de invasão que as grandes propriedades rurais correm em nosso País, é altamente recomendável que os empresários do agronegócio protejam seus investimentos. No concernente aos imóveis rurais, a medida jurídica que garante uma proteção mais eficaz é o Sistema de Registro Torrens

Veja também: o réu idoso perante a lei

sábado, 31 de janeiro de 2015

O que é uma presunção?

       Presunção é uma tomada de posição, por parte do legislador, a respeito de um determinado assunto. Através da presunção, o entendimento de uma situação é previsto na lei e é aceito como verdadeiro até que alguém, em um processo judicial, demonstre sua inveracidade. 

         Normalmente as presunções seguem a fórmula: "tal coisa é assim até prova em contrário". O 'até prova em contrário' indica que a presunção é relativa (juris tantum) e não absoluta (juris et de jure), pois esta última - a presunção absoluta - não admite prova em contrário. 

           Alguns exemplos de presunção: 

1 - Presume-se que o proprietário registral de um imóvel - aquela pessoa que consta na matrícula como último adquirente do bem - seja o verdadeiro proprietário até que se prove o contrário. 

2 - Quando alguém é citado para responder a uma ação e deixa o prazo de contestação passar sem apresentar defesa - situação essa denominada revelia -, presumem-se como verdadeiros os fatos alegados pelo autor. 

3 - Presume-se que os filhos de uma mulher casada tenham nascido na constância do casamento, ou seja: o marido dela é considerado o pai das crianças até prova em contrário. Presumem-se também havidos no curso do casamento os filhos nascidos até 300 dias após a dissolução da sociedade conjugal por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento. 

Veja também: como dar uma maior proteção jurídica à propriedade rural.

sábado, 24 de janeiro de 2015

Os costumes estrangeiros perante a lei brasileira

Atenção: este post só apresenta alguns fatos ocorridos e menciona o tratamento que as leis brasileiras dão a tais fatos. Não se pretende fazer um juízo de valor - se está certo ou errado - aos costumes aqui mencionados. 




      A legislação brasileira tem sua vigência em todo o território nacional, e se aplica tanto a brasileiros quanto aos estrangeiros residentes - bem como aos descendentes destes -. É notório que há uma grande diversidade de etnias residindo e trabalhando no Brasil.  Porém, quando um costume estrangeiro está em desacordo com as leis brasileiras, a Justiça vai aplicar, evidentemente, as leis brasileiras. 

         Essa preferência pela aplicação da lei brasileira em detrimento do costume estrangeiro se deve ao fato de que o costume estrangeiro contrário à lei brasileira não é norma jurídica. Pelo menos não aqui. Ou seja: se um determinado costume não afronta nenhuma lei brasileira ele pode ser observado livremente. Porém, se a lei brasileira trata do assunto de forma diferente do costume estrangeiro, prevalecerá, perante a justiça do Brasil, a lei nacional. Por exemplo: a poligamia, admitida em algumas culturas, não é permitida em nosso País. 

     Se é certo que a prosperidade brasileira se deve, em parte, ao espírito empreendedor dos imigrantes, também é certo que o Brasil é soberano para criar suas próprias normas jurídicas, às quais os imigrantes devem se adaptar.  

      Um caso peculiar de costume contrário às leis brasileiras é a tradição de algumas famílias italianas de deixar a maior parte da herança dos pais para os filhos homens em detrimento das filhas mulheres. Normalmente o pai transfere os bens para os filhos em vida, mas, como não se pode fazer a transferência direta do pai para um filho sem o consentimento dos demais, ele (o pai) usa um terceiro, ou seja: A (o pai), transfere para B (o terceiro) que transfere para C (o filho).

        O negócio entre A e B é apenas uma simulação para acobertar a transferência do bem do pai para o filho. Tal negócio jurídico é nulo, ou seja: para a lei, é como se tal negócio nunca tivesse ocorrido. Se uma compra e venda, por exemplo, for declarada nula por sentença devido à ocorrência de simulação, a propriedade do bem continua a ser do dono original. 

          Explicando melhor: se Pedro fez a venda simulada de uma fazenda para Paulo que, por sua vez, fez uma venda simulada para João - filho de Pedro - e ficar demonstrado que houve simulação , o juiz determinará que o registro de imóveis faça constar na matrícula do imóvel o nome de Pedro como proprietário. Uma das formas de provar a simulação é demonstrando, no processo, que o filho não possuía recursos financeiros suficientes para adquirir a fazenda na época do negócio.

         Em um caso concreto, houve uma venda simulada dessas e a filha ajuizou uma ação pedindo a declaração de nulidade dos negócios - do pai para o terceiro e do terceiro para seu irmão -. O terceiro contestou a ação alegando que não houve simulação e arrolou como testemunha a dona Nena, uma senhora octogenária, vizinha da família da autora. 

          Durante a audiência, a testemunha - no caso, a dona Nena - olhou com o cenho franzido para o réu - que a arrolou como testemunha -, olhou para o juiz e disse: "doutor, o Fulano transferiu 100 hectares de terra para esse sujeito passar para o Ciclano e ele só passou 50 até agora". E o juiz julgou procedente a ação - ou seja: deu ganho de causa para a parte autora, neta da dona Nena -.

          
PS: Embora possa parecer jocosa, essa espécie de ocorrência - a testemunha arrolada por uma parte dando um depoimento inconveniente para quem a arrolou - é muito comum, o que faz com que muitos advogados detestem a prova testemunhal.

Veja também: o que é presunção

sábado, 3 de janeiro de 2015

Inventariando o patrimônio da pessoa falecida


         
        Quando uma pessoa morre deixando patrimônio - bens, direitos e obrigações -, é necessário fazer um levantamento dos dados referentes ao falecido - onde morava por ocasião do falecimento, se era solteiro, casado, viúvo ou divorciado, se tinha filhos, se deixou testamento, etc. - e de seus ativos e passivos. 

       Se os herdeiros e/ou os sucessores ficarem inativos após o falecimento, os bens - imóveis, veículos, aplicações financeiras, etc. - continuarão registrados no nome do falecido. Para que tais bens sejam passados para o nome dos herdeiros ou sucessores, é necessário realizar o inventário - procedimento previsto em lei para arrolar os bens, partilhá-los e entregá-los aos herdeiros -, 

          A inspiração remota para o direito sucessório vem da natureza: as abelhas vivem em média 45 dias e durante sua existência produzem mel em quantidade superior à a necessária para a própria subsistência. A maior parte do mel que produzem fica para a próxima geração de abelhas. 

      Até algum tempo atrás só se podia fazer inventário judicialmente, até que a lei 11.441/07 desburocratizou um pouco o procedimento, permitindo que o mesmo fosse realizado no tabelionato, desde que os herdeiros sejam todos capazes e estejam de acordo com a partilha. Os sucessores devem ser representados por um advogado, tanto no inventário judicial como no inventário por escritura pública.

          É interessante mencionar que, com a morte, as dívidas do de cujus também se transferem para os sucessores, que responderão pelas mesmas até os limites das forças da herança. Ou seja: se o falecido deixou R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) de ativos e R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) de passivos, restarão R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) para serem partilhados pelos herdeiros. 

          Já se a totalidade dos ativos for inferior ao total dos passivos, os credores do falecido ficarão sem receber a diferença. Então, se os ativos eram de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) e o passivo era de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), os herdeiros serão responsáveis pela dívida até o limite de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).  

      Outro aspecto importante é que o cônjuge supérstite (o marido, mulher, companheiro ou companheira que sobreviveu à morte do de cujus) também herda uma parte do patrimônio, a depender do regime de bens do casamento ou da união estável. Se o regime de bens era o da comunhão universal, o cônjuge entra no rol de herdeiros. Se o regime de bens era o da comunhão parcial, o cônjuge herda uma parte dos bens adquiridos na constância do casamento/união estável. Já se o regime de bens era o da separação total de bens, o cônjuge supérstite não entra no rol dos herdeiros.

Veja também: os costumes estrangeiros perante a lei brasileira
                       decifrando o Direito

   

sábado, 27 de dezembro de 2014

Estado de perigo

        Pedro, cujo filho estava em risco de vida e precisava urgentemente de uma cirurgia cara, decidiu vender o seu carro, cujo valor de mercado era de R$ 40.000,00. Comunicou a situação a Paulo, que se aproveitou da situação desesperadora do outro e fez uma oferta de R$ 20.000,00 pelo veículo. Como a situação de saúde de seu filho era tão grave que não podia esperar vários anos para obter a cirurgia pelo SUS, Pedro vendeu o carro por R$ 20.000,00.
       
     Ora, depois de fazer a cirurgia, Pedro pode, se o desejar, ajuizar uma ação contra Paulo requerendo ao juiz a anulação do negócio, pois, ao celebrá-lo, sua declaração de vontade estava viciada pelo estado de perigo. Ou seja: se não fosse a situação de perigo iminente - conhecida pelo outro contratante, que se aproveitou dela para obter uma vantagem excessiva com o negócio -, Pedro não venderia o seu carro, ou o venderia pelo valor de mercado. 

         Quando duas ou mais pessoas celebram um contrato, o mesmo deve preencher alguns requisitos para que seja considerado juridicamente existente, válido e eficaz. A vontade das partes deve ser manifestada livre e conscientemente, ou seja: cada contratante deve saber exatamente a que está se obrigando e não pode ser 'forçado' a contratar. 

      Algumas pressões são admitidas implicitamente pelo ordenamento jurídico - publicidade, insistência -, outras não. Conforme o Código Civil atual - em vigor desde 2003 -, ninguém pode se aproveitar de uma situação de estado de perigo para impôr a outrem um contrato que seja excessivamente vantajoso para si e excessivamente prejudicial para a outra parte. 

         Na hipótese acima, Pedro pode pedir a anulação do negócio, devolvendo o valor pago por Paulo e retomando o veículo, ou a complementação do valor do carro. Qual dessas alternativas será definida na sentença? Aí vai depender do entendimento do juiz que julgar a ação.

Veja também: a utilidade do inventário

  

sábado, 20 de dezembro de 2014

Resolvendo uma situação fora do Judiciário

          

          O Sr. Eugênio procurou o advogado Pandolfo e lhe narrou a seguinte situação: "doutor, eu moro com minha esposa e meu filho de 27 anos em uma casa de dois quartos". "Há uma semana uma garota de 13 anos, vizinha nossa, saiu da casa dos tios onde residia e pediu para ficar uns dias na nossa casa".

          "Eu não estava em casa quando ela chegou". "Minha esposa a instalou no quarto do nosso filho". "Quando cheguei em casa e vi a situação fiquei preocupado, pois, se meu filho tiver relações sexuais com ela, poderá se complicar com a Justiça, afinal, ela tem menos de 14 anos". Pra piorar a situação, eu e minha esposa ficamos fora de casa o dia todo trabalhando e o meu filho, que está de férias, passa o dia em casa. 

            "Pedi à garota que ela voltasse para a casa do tio e ela não quis ir". "Minha esposa quer que ela fique conosco para ajudar no serviço doméstico". "Temo que isso possa nos custar uma ação trabalhista futuramente, isso se nós não formos acusados de permitir que a menina fosse abusada sexualmente em nossa casa". "Expliquei tudo isso para o tio dela e pedi que ele a pegasse de volta, mas ele fez pouco caso".

       Orientado pelo advogado, o Sr. Eugênio enviou uma carta ao tio da menina através do Tabelionato de Registro de Títulos e Documentos, fixando prazo para que ele levasse a garota de volta para casa. Poucos dias depois o Sr. Eugênio telefonou para o advogado: "doutor, o Fulano levou a garota de volta pra casa no outro dia e a situação está resolvida".

        Assim como o caso narrado acima, a interpelação extrajudicial pode ser usada para muitas finalidades: cobrança de dívidas, exigência de cumprimento de contratos, exigência de pedido de desculpas ou outra atitude qualquer. Tal procedimento, logicamente, não funciona em 100% dos casos, mas, quando funciona, evita-se de ter que ajuizar uma ação judicial contra a outra pessoa, envolvendo o Poder Judiciário e fazendo as partes perderem tempo, se estressarem e gastarem com custas e honorários.

          O procedimento é simples: escreve-se uma carta e se envia a mesma através do Tabelionato de Registro de Títulos e Documentos. O teor da carta vai variar conforme a situação, mas, à guisa de sugestão, pode ser assim: 

          No alto da carta (que deve ser digitada ou datilografada), se põe o nome completo do remetente e do destinatário (De:; Para:). Abaixo deve vir o título notificação (em letra maiúscula) e então o texto. No corpo do texto, deve-se narrar a situação, a pretensão do remetente e o prazo fixado para que o destinatário tome a atitude desejada. É de bom alvitre avisar que, se o destinatário não resolver a situação no prazo, o remetente tomará as medidas judiciais cabíveis

         Há pessoas que não se importam se forem processadas, mas outras ficam em pânico diante da mera possibilidade disso acontecer. Se o destinatário da interpelação for de uma índole parecida com a desse último grupo, a medida pode surtir efeito.

Veja também: estado de perigo

sábado, 13 de dezembro de 2014

Responsabilidade civil III: culpa e dolo

Atenção: para compreender melhor o texto abaixo, é necessário ler primeiro este aqui.

Introdução  


          O ato ilícito doloso ou culposo, tanto por ação (conduta comissiva) como por omissão (conduta omissiva), gera responsabilidade. O ilícito civil só gera, a princípio, efeitos civis, ou seja: o dever de restituir a coisa lesada ao estado que era antes, enquanto que o ilícito penal gera efeitos civis, penais e, conforme o caso, administrativos - por exemplo: o funcionário público condenado por peculato pode, como consequência da condenação, ser demitido de sua função -.

Responsabilidade objetiva da pessoa jurídica


          Todo ato ilícito civil cometido por um funcionário público ou funcionário de empresa privada deve ser indenizado. Basta que a vítima demonstre a culpa do preposto ou do funcionário que provocou o dano e o Estado e/ou a empresa responderão objetivamente, ou seja: independentemente de culpa.

Responsabilidade subjetiva da pessoa física


       Já a pessoa física que comete um ato ilícito - tanto penal quanto civil - só responderá pelos efeitos jurídicos do mesmo se tiver procedido com dolo ou culpa. A diferença entre dolo e culpa é mais relevante no Direito Penal do que no Direito Civil. Com efeito, normalmente a pena prevista legalmente para o crime doloso é mais rígida do que a pena para o crime culposo

A culpa e o dolo no ilícito penal 


       No crime doloso, o agente quer provocar o dano à vítima, enquanto que, no crime culposo, o dano não é intencional e só ocorre porque o autor do crime procedeu com negligência, imprudência ou imperícia. O dolo pode ser direto ou eventual e a culpa pode ser consciente ou inconsciente.

        No dolo direto, o agente deseja o resultado danoso. Por exemplo: João, dirigindo seu automóvel, vê à sua frente André, seu desafeto, atravessando a rua. Então João acelera o veículo com a clara intenção de atropelar André. 

      No dolo eventual, o agente não deseja diretamente o resultado. Porém sabe que há a possibilidade de que sua conduta resulte em algum dano a outrem, não se importando com essa possibilidade. Por exemplo: João dirige seu veículo em uma avenida movimentada a 120 km/h. Ele não quer, a princípio, atropelar ninguém, mas sabe que isso pode acontecer e tal possibilidade lhe é indiferente.

        Na culpa consciente o agente prevê o resultado, mas espera que ele não ocorra, supondo poder evitá-lo com a sua habilidade. Por exemplo: João dirige seu veículo em alta velocidade e, sabendo da possibilidade de ocorrer um acidente, crê ter habilidade suficiente para evitar acidentes em quaisquer situações que se apresentem. 

    Na culpa inconsciente, o agente não prevê o resultado, que, entretanto, era objetiva e subjetivamente previsível. Por exemplo, o cirurgião que esquece um instrumento cirúrgico no corpo do paciente e este acaba falecendo em razão de uma hemorragia decorrente de uma perfuração causada pelo objeto. O médico que deixou de tomar o devido cuidado - negligência -, não previu o que era previsível - afinal, em toda a cirurgia invasiva é possível, em tese, esse tipo de ocorrência -, responderá por homicídio culposo.

A culpa e o dolo no ilícito civil 


        Tendo ocorrido um ilícito civil, o agente, se sua conduta foi dolosa ou culposa, responderá integralmente pelos prejuízos causados à vítima - ou seja: a culpa e o dolo não vão influenciar no tamanho da reparação -. 

        O autor do ilícito só não responderá integralmente pelos danos causados à vítima se o acidente: a) ocorreu por culpa exclusiva da vítima ou; b) ocorreu por fato de terceiro, ou ainda; c) ocorreu devido a um caso fortuito ou a uma força maior -. As hipóteses de exclusão da responsabilidade civil serão abordadas mais detalhadamente em um futuro post.

Veja também: resolvendo uma situação fora do Judiciário