Lei Simplificada

sábado, 13 de dezembro de 2014

Responsabilidade civil III: culpa e dolo

Atenção: para compreender melhor o texto abaixo, é necessário ler primeiro este aqui.

Introdução  


          O ato ilícito doloso ou culposo, tanto por ação (conduta comissiva) como por omissão (conduta omissiva), gera responsabilidade. O ilícito civil só gera, a princípio, efeitos civis, ou seja: o dever de restituir a coisa lesada ao estado que era antes, enquanto que o ilícito penal gera efeitos civis, penais e, conforme o caso, administrativos - por exemplo: o funcionário público condenado por peculato pode, como consequência da condenação, ser demitido de sua função -.

Responsabilidade objetiva da pessoa jurídica


          Todo ato ilícito civil cometido por um funcionário público ou funcionário de empresa privada deve ser indenizado. Basta que a vítima demonstre a culpa do preposto ou do funcionário que provocou o dano e o Estado e/ou a empresa responderão objetivamente, ou seja: independentemente de culpa.

Responsabilidade subjetiva da pessoa física


       Já a pessoa física que comete um ato ilícito - tanto penal quanto civil - só responderá pelos efeitos jurídicos do mesmo se tiver procedido com dolo ou culpa. A diferença entre dolo e culpa é mais relevante no Direito Penal do que no Direito Civil. Com efeito, normalmente a pena prevista legalmente para o crime doloso é mais rígida do que a pena para o crime culposo

A culpa e o dolo no ilícito penal 


       No crime doloso, o agente quer provocar o dano à vítima, enquanto que, no crime culposo, o dano não é intencional e só ocorre porque o autor do crime procedeu com negligência, imprudência ou imperícia. O dolo pode ser direto ou eventual e a culpa pode ser consciente ou inconsciente.

        No dolo direto, o agente deseja o resultado danoso. Por exemplo: João, dirigindo seu automóvel, vê à sua frente André, seu desafeto, atravessando a rua. Então João acelera o veículo com a clara intenção de atropelar André. 

      No dolo eventual, o agente não deseja diretamente o resultado. Porém sabe que há a possibilidade de que sua conduta resulte em algum dano a outrem, não se importando com essa possibilidade. Por exemplo: João dirige seu veículo em uma avenida movimentada a 120 km/h. Ele não quer, a princípio, atropelar ninguém, mas sabe que isso pode acontecer e tal possibilidade lhe é indiferente.

        Na culpa consciente o agente prevê o resultado, mas espera que ele não ocorra, supondo poder evitá-lo com a sua habilidade. Por exemplo: João dirige seu veículo em alta velocidade e, sabendo da possibilidade de ocorrer um acidente, crê ter habilidade suficiente para evitar acidentes em quaisquer situações que se apresentem. 

    Na culpa inconsciente, o agente não prevê o resultado, que, entretanto, era objetiva e subjetivamente previsível. Por exemplo, o cirurgião que esquece um instrumento cirúrgico no corpo do paciente e este acaba falecendo em razão de uma hemorragia decorrente de uma perfuração causada pelo objeto. O médico que deixou de tomar o devido cuidado - negligência -, não previu o que era previsível - afinal, em toda a cirurgia invasiva é possível, em tese, esse tipo de ocorrência -, responderá por homicídio culposo.

A culpa e o dolo no ilícito civil 


        Tendo ocorrido um ilícito civil, o agente, se sua conduta foi dolosa ou culposa, responderá integralmente pelos prejuízos causados à vítima - ou seja: a culpa e o dolo não vão influenciar no tamanho da reparação -. 

        O autor do ilícito só não responderá integralmente pelos danos causados à vítima se o acidente: a) ocorreu por culpa exclusiva da vítima ou; b) ocorreu por fato de terceiro, ou ainda; c) ocorreu devido a um caso fortuito ou a uma força maior -. As hipóteses de exclusão da responsabilidade civil serão abordadas mais detalhadamente em um futuro post.

Veja também: resolvendo uma situação fora do Judiciário 

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Responsabilidade civil II: perdas e danos

Atenção: para compreender melhor este texto, é necessário primeiro ler este aqui.


             No dia 27 de março de 2014 escrevemos o seguinte: 
            
             Quando alguém, mediante ação ou omissão, comete ato ilícito - que pode ser doloso ou culposo - e causa dano a outrem, fica obrigado a reparar o dano. Essa obrigação de reparar o dano, restabelecendo, na medida do possível, a coisa danificada ao estado que era antes - em latim, status quo ante - se chama responsabilidade civil. 

             Mas pode surgir o seguinte questionamento: afinal, quais são os danos que devem ser indenizados? É pra esclarecer esse ponto que escrevemos este post.

             Tanto o ilícito penal quanto o civil têm, como já vimos, o condão de gerar, para o autor do ato, a responsabilidade de indenizar os danos causados, desde que ele tenha agido com dolo - ou seja: com a intenção de causar o dano - ou com culpa - ou seja: o agente não teve a intenção direta de causar o dano mas agiu com imprudência, negligência ou imperícia¹ -.

             Havendo nexo causal - relação de causa e efeito - entre a ação do autor e o dano, as perdas e danos decorrentes do ato danoso devem ser restituídas ao estado que era antes. As perdas e danos abrangem o dano emergente e o lucro cessante.

             O dano emergente é o prejuízo material e/ou físico e/ou moral que a vítima efetivamente teve em decorrência do ato ilícito. O lucro cessante é o rendimento/lucro que a vítima deixará de ganhar por conta do acidente.

             Exemplificando: se, em um cruzamento, Antenor avança o sinal vermelho e colide seu carro contra a moto de Vinícius, este possivelmente terá: danos materiais (o conserto da moto), danos físicos (despesas decorrentes do acidente, tais como: internação hospitalar, honorários médicos com cirurgias corretivas, cirurgia reparadora para reduzir eventual dano estético, próteses, fisioterapia, etc) e quem sabe até danos morais. 

             Esses danos descritos no parágrafo anterior constituem o dano emergente.

             E o lucro cessante? Bem, supondo que Vinícius trabalhe como motoboy autônomo, ele evidentemente não poderá trabalhar no período em que estiver hospitalizado. Ainda que não precise de hospitalização, ele não poderá trabalhar enquanto sua moto não estiver consertada. Os rendimentos que Vinícius vai deixar de ganhar enquanto não puder retornar ao trabalho são os lucros cessantes.

¹:           A imprudência é a precipitação, ou seja: o sujeito agiu antes do momento correto, ou antes que as condições estivessem adequadas àquela espécie de ação. A negligência é a atitude em que o autor, tendo em mãos o conhecimento e as ferramentas para agir da forma adequada, executa a ação de qualquer maneira, por preguiça, desleixo ou desatenção. E a imperícia é a ação daquele que, sem ter o conhecimento técnico para fazer algo, o faz, cometendo erros e prejudicando alguém no processo.

Veja também: responsabilidade civil III: responsabilidade civil III: culpa e dolo    






sábado, 29 de novembro de 2014

Os honorários advocatícios: limites


1 - Introdução

1.1 - Razões para se contratar um advogado

        
         Salvo poucas exceções - como nos pedidos de habeas corpus e em algumas causas dos juizados especiais - as pessoas em geral só podem ajuizar ações se estiverem representadas por um advogado, uma vez que este é o profissional habilitado a apresentar pedidos aos juízes e tribunais. Atuar como procurador em juízo exige uma preparação mínima - bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais e a inscrição na OAB - que não são todas as pessoas que possuem.

1.2 - O preconceito contra os advogados e as suas consequências


      As pessoas sem inscrição na OAB, quando se veem envolvidas em problemas jurídicos, passam a necessitar dos serviços dos advogados. Mas, devido ao grande preconceito que existe contra essa profissão, as pessoas resistem à ideia de pagar honorários a quem lhe representa. Alguns consideram um crime contra a humanidade 'dar dinheiro pra advogado', pois imaginam erroneamente que todos os causídicos são ricos e desonestos. Então a mesma pessoa que se sujeita a pagar dois mil reais por um IPhone que será substituído em dois anos se nega a pagar duzentos reais por uma consulta com um advogado, com o detalhe de que, às vezes, a consulta evitada 'para poupar' poderia evitar um prejuízo de milhares de reais no futuro.

1.3 - A Defensoria Pública e suas dificuldades


       Em alguns municípios existe a Defensoria Pública, que é um órgão constituído por procuradores que recebem salário do Estado para defender gratuitamente os pobres. Os defensores públicos normalmente têm milhares de processos para cuidar ao mesmo tempo e, por conta disso, ficam sem condições de prestar um serviço individualizado. Além disso, para conseguir uma ficha de atendimento, os interessados precisam chegar de madrugada à sede da Defensoria e passar por uma triagem para comprovar seu estado de hipossuficiência (pobreza). É o SUS da advocacia.  

1.4 - A busca da quadratura do círculo


         Quem não consegue passar na triagem da Defensoria Pública ou não pretende utilizar seus serviços porque quer um serviço mais atencioso - que o volume de trabalho dos defensores  públicos normalmente não permite -, procura um advogado. E então alguns clientes tentam conseguir a quadratura do círculo: querem um serviço gratuito ou muito barato e bem feito, pois, se não se importassem com a qualidade do serviço, ficariam com a Defensoria mesmo. 

         É interessante observar que os honorários representam para os advogados o mesmo que o subsídio para os magistrados, o soldo para os militares, a comissão para os vendedores e o salário para o trabalhador. Mas nada disso importa: para alguns o advogado tem que trabalhar de graça ou mediante contrato de risco porque é feio pretender a obtenção de pagamento pelo seu trabalho

2 - As diversas espécies de honorários e os seus limites


           Mas afinal, quanto o advogado pode cobrar? Existe algum limite?

          O Estatuto da Advocacia - lei 8.906/94 - dispõe que os advogados têm direito a três espécies de honorários: a) os convencionados; b) os fixados por arbitramento judicial e; c) os de sucumbência. É importante observar que o advogado nunca recebe todas essas espécies de remuneração pela mesma causa, pois os honorários arbitrais - que serão explicados logo adiante - só são pagos quando não há contrato ou sucumbência. Às vezes alguns advogados recebem honorários contratuais e sucumbenciais e às vezes apenas os contratuais ou nem isso - quando, estando o causídico atuando mediante contrato de risco, o cliente perde a ação.

         Os honorários convencionados são pagos pela parte que contratou o advogado, os honorários sucumbenciais são pagos pela parte contrária se esta perder a ação e os honorários fixados por arbitramento tem seu valor fixado pelo juiz e o seu pagamento será efetuado de acordo com cada processo - p. ex.: em um processo de falência, os honorários do síndico da massa falida serão pagos com o valor arrecadado mediante a venda dos bens da própria massa falida -. 

      No caso dos honorários convencionados, o contrato de honorários pode estipular que o contratante vai pagar uma parte da verba honorária no início do processo e mais um percentual do valor que o cliente ganhar com a causa. Ou, dependendo da negociação entre as partes, pode-se estipular que o advogado só vai ganhar um percentual sobre a vantagem, a qual evidentemente só existirá em caso de vitória na ação - o já mencionado contrato de risco. 

          A limitação ao valor dos honorários convencionados é a seguinte: o advogado não pode ter mais vantagem com a causa que o seu cliente. Exemplificando: se um advogado tem um contrato que lhe garante 50% da vantagem auferida pelo cliente em um processo e o juiz fixa 10% de verba sucumbencial, esse advogado poderá ganhar, com o processo, mais do que o seu cliente (60% a 40%, na hipótese), o que não é permitido. Em caso de sucumbência a 10%, o advogado poderia ganhar no máximo 45% da vantagem e então o cliente ficaria com 55% e o advogado 55%: 45% de honorários contratuais e 10% de honorários sucumbenciais.  

       Os honorários sucumbenciais são fixados na sentença - em valor nunca superior a 20% da condenação - e são pagos pela parte que perdeu a ação ao advogado da parte que a venceu. Esse valor é pago ao advogado porque a Lei 8.906/94 estipulou que os honorários de sucumbência pertencem ao advogado. Recentemente a juíza Federal substituta Catarina Volkart Pinto proferiu uma decisão interlocutória determinando que os honorários sucumbenciais deveriam ser pagos à parte que contratou o advogado. Há mais detalhes sobre essa decisão aqui.

        Com todo o respeito à eminente magistrada, e sem entrar em detalhes sobre a consistência de seus argumentos - já que essa espécie de discussão é mais fácil de ser compreendida por juristas do que por não juristas e iniciá-la aqui seria contrário à pretensão de simplicidade deste blog -, se esse entendimento se cristalizar isso poderá trazer duas consequências: a) poucos advogados vão querer trabalhar mediante contrato de risco, e isso levaria todos os cidadãos que não podem pagar adiantamento aos seus advogados às portas da já sobrecarregada Defensoria Pública, ou; b) os advogados que topassem trabalhar mediante contrato de risco só o aceitariam se o percentual fosse aumentado, e isso elevaria o custo dos honorários contratuais dos costumeiros 20% a 30% ou até mais.









sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Fraude contra credores

Para compreender este post, é importante antes ler este e este.


Introdução           


           Há em nosso País muitas pessoas endividadas. Algumas dessas pessoas contraíram dívidas por motivos justificáveis: desemprego, crise econômica, doença na família que desequilibrou o orçamento, etc. Já algumas outras pessoas decidiram ter um estilo de vida em que simplesmente não pagam suas contas. 

           É lógico que, se João não paga suas contas, seus credores logo estarão protestando seus títulos e ajuizando ações de cobrança/execução contra ele. O sucesso dessas ações depende da existência de bens livres e desembaraçados em nome de João. Denominam-se livres e desembaraçados os bens do devedor que não estão gravados com alguma restrição: hipoteca, alienação fiduciária, arresto ou penhora preexistentes...

          Ou seja: se o devedor possui bens penhoráveis, o credor tem chance de receber seu crédito, mas se o devedor não possui nada - ou pelo menos não possui nada em seu nome -, a cobrança da dívida fracassa e o credor fica a ver navios. E é por saber disso que alguns devedores vivem um estilo de vida superior ao que seus rendimentos normalmente suportariam: eles escolhem não honrar todos os seus compromissos.

Estratégias dos devedores


Adquirir bens em nome de terceiros

       Quem tem a pretensão de não honrar os próprios compromissos evita adquirir bens em seu próprio nome. E quando adquire bens, ou o faz usando o nome de outras pessoas - o popular laranja -, ou adquire os bens mediante financiamento - mesmo que possa comprar à vista -. Se for comprado mediante financiamento, o bem ficará com uma restrição - hipoteca, alienação fiduciária, etc. - e não poderá ser penhorado. É claro que o credor pode pedir a penhora sobre os direitos e ações que o devedor possui sobre o bem alienado, porém quando isso ocorre o devedor normalmente 'esquece' de pagar as demais parcelas do financiamento.  

Venda em fraude à execução

     Essa é uma das estratégias mais comuns: o sujeito é citado para responder a uma ação que provavelmente perderá. Então ele faz vendas - verdadeiras ou simuladas - ou doações de todos os bens passíveis de penhora que estão em seu nome. Assim, quando a ação chega à fase executiva, o credor não consegue localizar bens no nome do executado para requerer a penhora. 

        Se o credor conseguir provar que a venda/doação foi feita para frustrar a execução, o juiz profere sentença anulando o negócio e determina a penhora do bem.

O falso divórcio 


         Às vezes, quando o devedor é casado - ou vive em união estável -, ele entra em conluio com seu cônjuge para fazer um divórcio simulado. Naturalmente isso ocorre após o início de uma ação que pode fazer com que ele tenha parte do seu patrimônio penhorado e levado a leilão.

        O procedimento utilizado normalmente é: o casal continua coabitando normalmente e realiza um divórcio consensual, em que o marido fica com as dívidas do casal e a mulher fica com os ativos - bens e direitos -. Quando o credor do marido vai procurar bens em seu nome, não encontra absolutamente nada. 

       Também nesse caso cabe ao credor fazer a prova da fraude - prova essa um tanto difícil de se fazer - e pedir que a penhora recaia sobre o patrimônio do casal 'divorciado'.

A ação trabalhista de um cônjuge contra o outro


         Há pessoas que, ao fundar uma empresa, assinam a CTPS - Carteira de Trabalho e Previdência Social - de seus cônjuges. O cônjuge 'empregado' nunca aparece na empresa para trabalhar. Então um dia a empresa é processada e o que é que o casal faz? O cônjuge 'empregado/reclamante' ajuíza uma ação trabalhista contra o 'empregador/reclamado'. 

         Quando isso ocorre, o reclamado não contesta a ação e deixa a mesma correr em revelia - para que a tramitação ocorra mais rápido -. Então o cônjuge 'empregado' vence a causa e pede a execução dos bens do 'patrão', que continua sem se defender. 

         Os bens são então penhorados, avaliados, leiloados e o produto do leilão é entregue ao  cônjuge 'empregado', evitando, assim, que o dinheiro proveniente desse leilão fosse utilizado para pagar outras dívidas, sejam elas fiscais, trabalhistas ou decorrentes de empréstimos não pagos. 

      Nesse tipo de situação, o credor tem que examinar a possibilidade de se ajuizar uma ação rescísória da sentença trabalhista que concedeu o crédito ao cônjuge empregado.

Conclusão


        Enfim, essas são algumas das estrategias usadas pelos devedores para frustrar os credores de suas dívidas. Existem outros meios que os caloteiros podem usar para esse fim - enviar dinheiro para o Exterior sem comunicar a Receita Federal, por exemplo -, mas acreditamos que os métodos mencionados são suficientes para que os leitores tenham uma ideia de com o que estão lidando. Não é impossível fazer a cobrança contra um caloteiro contumaz, mas é custoso em termos de tempo, dinheiro - necessário para fazer buscas de bens em cartórios e investigações - e energia emocional.





sábado, 15 de novembro de 2014

O profissional liberal e suas obrigações

Para compreender melhor este post, é conveniente ler primeiro esse aqui.


Introdução    


   Muitas pessoas acreditam que um profissional liberal tem a obrigação de obter o resultado pretendido por seu cliente, mas isso não é verdade. O profissional liberal normalmente só tem a obrigação de utilizar todos os meios técnicos existentes para buscar a obtenção do resultado. Mas antes de prosseguirmos, precisamos definir quem é profissional liberal.

O profissional liberal


      O profissional liberal é aquele trabalhador que exerce a sua atividade de forma autônoma, ou seja: sem vínculo empregatício, normalmente trabalhando para mais de um tomador de serviço. É muito comum que prestadores de serviços - médicos, engenheiros, arquitetos, advogados - sejam profissionais liberais. 

       O profissional liberal precisa, no exercício de seu trabalho, utilizar toda a perícia, todo o cuidado, toda a diligência e todos os meios técnicos disponíveis para tentar obter para seu cliente aquilo que o cliente almeja. Mas a eventual não obtenção do resultado por razões alheias à competência técnica do profissional não gera o dever deste indenizar o seu cliente. 

       Em outras palavras: o médico não tem a obrigação de curar o paciente - obrigação de resultado - e sim a obrigação de fazer tudo o que for possível para tentar obter a cura - obrigação de meio -. O advogado não tem a obrigação de vencer a causa e sim o dever de utilizar todos os recursos jurídicos disponíveis para tentar obter a vitória.

Promessa de resultado


      A exceção à regra mencionada acima é aquele caso em que o profissional promete o resultado - por exemplo: o cirurgião plástico que garantir que a paciente vai ficar com o nariz igual ao da Gisele Bündchen após uma rinoplastia -. Se tiver ocorrido a promessa do resultado, então o profissional responderá civilmente pela sua não obtenção e só se eximirá do dever de indenizar o cliente se demonstrar que não foi por sua culpa que o resultado não foi obtido. 

      Ou seja: se houve a promessa de um determinado resultado e tal resultado não foi obtido, o profissional tem o ônus de provar que não foi por sua culpa que se frustrou a busca por esse resultado. Caso ele não consiga fazer essa prova terá que indenizar o cliente pelas perdas e danos decorrentes da não obtenção da meta definida por ele - pelo cliente -, 

         Sobre a cirurgia plástica, há que se fazer mais algumas considerações: existe a cirurgia plástica reparadora e a cirurgia plástica meramente estética. Aquela visa reduzir o dano estético produzido por um acidente, ou por um defeito congênito ou por uma cirurgia estética, enquanto que esta tem o objetivo único de embelezar o paciente.

         Na cirurgia reparadora o médico tem apenas a obrigação de meio, ou seja: caso não se obtenha o resultado, não há que se falar em responsabilidade do médico, a menos que o paciente prove que o resultado não foi obtido por culpa do profissional.

       Já na cirurgia embelezadora a situação pode ser diferente: se houver a promessa de resultado, então o médico tem a obrigação de obter o resultado prometido, respondendo pela sua não obtenção como mencionado anteriormente.

Veja também: fraude contra credores

sábado, 8 de novembro de 2014

Oportunidade perdida: antecipação de tutela


          
          Carlos era estudante de Direito e estava fazendo um estágio na Justiça Federal. Um dia, em uma audiência, ele assistiu a uma cena em que o advogado do autor poderia ter solucionado o problema do cliente na hora. Porém o advogado 'cochilou' e a situação demorou mais um ou dois meses para ser resolvida. 

           Tratava-se de uma ação previdenciária em que o cliente - que chamaremos de João da Silva - requeria a aposentadoria por tempo de contribuição. No decorrer da audiência, o Sr. João descreveu sua situação ao juiz: "doutor, eu vim a pé até a audiência porque não tinha dinheiro para o ônibus, eu não tenho nem o que comer". 

         Nisso o juiz anunciou o seguinte: "está encerrada a instrução, eu vou prolatar a sentença no prazo de X dias e já aviso que vou julgar procedente a ação". Em outros termos: o juiz analisou as provas, viu que o Sr. João tinha razão e devia ser aposentado mesmo. 

        Esse aviso do juiz foi uma senha para que o advogado pedisse a antecipação de tutela. A antecipação de tutela pode ser requerida no curso do processo se o juiz se convencer da veracidade do pedido inicial e se: a) houver fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação - aplicável ao caso do Sr. João -, ou; b) fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu (art. 273 do CPC).  

            Ora, se o juiz disse que ia julgar a ação procedente é porque ele tinha o pedido do autor como certo e comprovado. O risco na demora da ação demonstrava o fundado receio de dano irreparável - devido à situação crítica vivida pelo autor, que estava a padecer de fome -. Havia naquele caso concreto fundamento jurídico para se requerer a antecipação de tutela, porém o advogado não percebeu e deixou a oportunidade passar. 

            É claro que o juiz não poderia dizer ao advogado: doutor, peça a antecipação de tutela que eu a concedo imediatamente. Nem o juiz podia fazer isso - para não ser acusado de parcialidade, o que levaria ao seu afastamento do processo e à anulação e repetição dos atos processuais realizados - e muito menos o procurador do INSS - pois aí ele estaria advogando contra o seu constituinte, no caso, a autarquia federal -.

          Lamentável essa falta de atenção do procurador do autor, que poderia ter obtido para seu cliente o pagamento da primeira parcela da aposentadoria no mesmo dia e, ao invés disso, fez com que o postulante tivesse que sobreviver às duras penas por mais um ou dois meses.

Veja também: o profissional liberal e suas obrigações

sábado, 1 de novembro de 2014

Quando é cabível a equiparação salarial?


       
         Uma dúvida que aflige alguns trabalhadores é: em quais casos é cabível a ação de equiparação salarial? A questão surge porque em algumas empresas há empregados que recebem salários superiores aos dos colegas mesmo exercendo a mesma função. Então os funcionários que ganham menos ficam a se perguntar se essa prática não é ilegal.

       Ora, a princípio, trabalhadores que exercem a mesma função devem receber salários iguais, porém essa regra tem algumas condições. A CLT estabelece em que condições pode ocorrer a equiparação exigindo como requisitos que:

1 - o trabalho seja prestado ao mesmo empregador;

        O operador de empilhadeira da empresa A não pode exigir o mesmo salário do operador de empilhadeira da empresa B, pois são empresas diferentes.

2 - na mesma localidade;

          É considerado exercido na mesma localidade o serviço prestado no mesmo município. Admite-se, nas regiões metropolitanas, equiparação salarial entre os empregados da mesma empresa que prestam serviços em unidades situadas em municípios diferentes.

3 - entre empregados da mesma função;

        Ainda que os empregados tenham cargos com nomes diferentes, o que conta é a espécie de trabalho que é executada, e não o nome do cargo.

4 - com diferença de tempo na função não superior a dois anos;

          Quem começou a trabalhar operando empilhadeira no ano passado não pode pretender receber o mesmo salário de quem está nessa função há dez anos.

5 - que exerça o trabalho com a mesma produtividade;

         Se o trabalho é remunerado pelas horas, quem trabalha o mesmo número de horas que o colega de salário superior - o paradigma - tem direito a um salário igual ao do paradigma. Se a remuneração é por peça produzida, pode haver salário maior para quem produz uma maior quantidade de peças - ou seja: nessa hipótese não é ilegal a disparidade salarial -.

6 - que tenha a mesma perfeição técnica;

          No caso de remuneração por peça produzida, a qualidade do serviço também pode influenciar no salário - ou seja: o trabalhador só pode postular salário igual ao do paradigma se o seu trabalho for do mesmo nível de perfeição que o dele - e não apenas a quantidade de serviço executado.

7 - e que exista simultaneidade na prestação de serviços.

         Pode haver diferenças salariais em relação ao turno em que o serviço é prestado em razão do adicional noturno.

         Ou seja: quem exerce função igual deve receber salário igual sim, desde que sejam observadas as condições acima. O direito à equiparação salarial pode ser reclamado ainda que o reclamante tenha saído do emprego - observado o prazo de dois anos para o ajuizamento da ação -. Ajuizada a ação, podem ser pleiteadas as diferenças salariais dos cinco anos anteriores ao ajuizamento.

Veja também: antecipação de tutela