Lei Simplificada

sábado, 28 de junho de 2014

Prisão por dívida


           
             O escritor Miguel de Cervantes foi preso por dívida em duas ocasiões. Isso ocorreu porque, desde a Antiguidade, entendia-se que a pessoa do devedor respondia pela dívida. Os direitos do credor eram bem mais extensos do que atualmente. No direito romano, por exemplo, o credor podia tomar o devedor como escravo, vendê-lo em partes - há controvérsias quanto a esse direito -, etc.

             Após o Iluminismo, a responsabilidade pela dívida saiu da pessoa do devedor e passou para o patrimônio - bens e direitos - dele. A cobrança das dívidas passou a ser realizada com a tomada, por parte do Estado, de bens do patrimônio do devedor, que, ou são vendidos em leilão sendo o produto da venda entregue ao credor, ou o próprio bem é entregue ao credor como pagamento.

             Esse novo entendimento em relação à responsabilidade pela dívida trouxe como consequência a ilegalidade da prisão por dívida nas legislações da maioria dos países ocidentais. Entretanto, por longa data houve duas exceções à regra da proibição da prisão civil por dívida, que eram os casos da dívida de alimentos e o da punição do depositário infiel.

             O devedor de alimentos que deixava de efetuar o pagamento de sua obrigação no prazo podia - e ainda pode - ser preso em decorrência do inadimplemento. Mas a prisão civil do depositário infiel já não é mais admitida pelos nossos tribunais.

             Explicando sucintamente: depositário é a pessoa que recebe a incumbência de ter em sua guarda algum bem. Essa incumbência pode decorrer da lei, do contrato ou de uma ordem judicial e obriga o depositário a cuidar da coisa como se fosse sua. Até alguns anos atrás, se a coisa perecesse - estragasse - por culpa do depositário, considerava-se que este tinha sido infiel, o que acarretava a sua punição com a prisão.

             Por exemplo: em uma ação de cobrança que já estava na fase de execução, era a feita a penhora de um automóvel, sendo o devedor/executado nomeado depositário. Sabendo que aquele carro seria levado a leilão, havia casos de devedores que deixavam o carro fora da garagem sofrendo com a ação do tempo, para que desvalorizassem a tal ponto de frustar o leilão. Até algum tempo atrás, esse devedor/depositário seria preso por não ter tido zelo com a coisa posta em sua guarda, mas atualmente tal atitude já não é mais passível de punição com a prisão civil.

            Concluindo, o tratamento jurídico às partes de uma ação de cobrança está melhor para o devedor do que para o credor, fato esse que pode ser confirmado por qualquer advogado que atue em processos cíveis em fase executiva.

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Veja também: o direito à saúde.

sábado, 21 de junho de 2014

Doação de pai para filho com reserva de usufruto: tenha cuidado


Quando uma pessoa morre, todo o seu patrimônio - tanto os bens e direitos quanto as dívidas - passam para os herdeiros. Porém, para que os herdeiros possam ter os bens registrados em seus respectivos nomes, é necessário fazer o inventário.

O inventário, que pode ser feito judicialmente ou no cartório - neste caso apenas se os herdeiros forem todos maiores e capazes - é o arrolamento dos bens, direitos e obrigações do falecido, bem como a listagem dos herdeiros legítimos e/ou testamentários e a definição do quinhão de cada um. 

É notório que o inventário é um procedimento demorado - se for feito judicialmente - e dispendioso, afinal, é preciso contratar advogado, pagar custas, impostos e emolumentos, etc. Então algumas pessoas, pensando no bem estar de seus herdeiros, fazem a transferência dos seus bens já em vida para os filhos, reservando para si o direito de usufruto dos bens. 

Explicando sucintamente: no direito de usufruto, estão presentes pelo menos duas pessoas: o nu proprietário e o usufrutuário. O nu proprietário é o dono da coisa mas não pode utilizá-la nem recolher os frutos da mesma e o usufrutuário não é dono, mas pode usar a coisa e recolher seus frutos, sejam naturais - frutos de árvores situadas no terreno, por exemplo - ou civis - alugueis, arrendamentos, etc.

Então, como já afirmamos anteriormente, algumas pessoas transferem a nua propriedade de seus bens para os filhos, reservando para si o direito de usufruto. A intenção é poder utilizar o patrimônio enquanto estiverem vivos, e, quando falecerem, os filhos não terem a necessidade de fazer inventário, pois bastará, nesse caso, comunicar ao Registro de Imóveis o falecimento do usufrutuário para ser reconhecido o fim do usufruto. É mais simples e mais barato do que fazer inventário.

O problema é que alguns filhos cansam de esperar pela morte dos pais e querem utilizar esse patrimônio logo. Então, usando um subterfúgio qualquer, convencem os pais a renunciarem o direito de usufruto sobre os bens. E no momento em que os pais renunciam o usufruto e eles passam a ter a propriedade plena dos bens, os pais são enviados a uma casa de repouso - conhecida popularmente como asilo - e os filhos passam então a desfrutar dos bens. 

Vamos citar um caso concreto: o pai, agricultor, passou a terra que possuía para o nome do filho, reservando para si o direito de usufruto. O filho, estimulado pela esposa, que não gostava de cuidar do sogro, pediu para o pai renunciar o usufruto de parte da terra 'para poder tomar um empréstimo no banco'. E o pai renunciou. 

No ano seguinte, o filho pediu para o pai renunciar o usufruto de mais um pedaço da terra para poder negociar outro empréstimo e o pai renunciou. E assim, de pedaço em pedaço, o pai abriu mão do direito de usufruto de toda a terra, e, tão logo isso aconteceu, foi enviado para o asilo.

Então, pense bem antes de transferir seus bens para seus filhos em vida, pois isso poderá causar sua ruína. Talvez seja mais conveniente deixar que os herdeiros se desdobrem para fazer o inventário depois de seu passamento. Mas, se você já passou a nua propriedade do seu patrimônio para os seus herdeiros, então não abra mão do usufruto sob pretexto nenhum.

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Veja também: prisão por dívida




sábado, 14 de junho de 2014

Cuidado com o status do Facebook

           
           
              Algumas pessoas modificam seus status de facebook para 'em um relacionamento sério com Fulano ou Ciclana...' ao iniciar um namoro. Só que essa decisão pode ter consequências jurídicas futuramente, uma vez que alguns juízes entendem que, se alguém declara que está em um relacionamento sério nas redes sociais, esse relacionamento equivale à união estável.

              Um relacionamento equivaler à união estável é semelhante a estar casado, do ponto de vista jurídico, já que a Constituição Federal estabeleceu, já em 1988, que a união estável tem o mesmo status jurídico do casamento.

              Ou seja: se você começa a namorar alguém e modifica seu status para 'em um relacionamento sério', isso poderá ser usado como prova contra você. E, talvez no futuro, se houver um rompimento do relacionamento e você tiver adquirido algum bem, você venha a ter que dividir esse bem com o (a) ex-namorado (a), pagar pensão alimentícia, etc.

              Foi o que aconteceu com Reinaldo, que começou a namorar Andréia há quatro anos e nesse período adquiriu um automóvel. Após Reinaldo tomar a iniciativa de romper o relacionamento, Andréia ajuizou contra ele uma ação de dissolução de união estável, requerendo a partilha do automóvel. E assim, o automóvel foi a leilão e Reinaldo ficou com apenas metade do $ arrecadado com a venda - que foi feita por um preço abaixo do valor de mercado inclusive.

             Concluindo, é preciso ter muito cuidado ao modificar o seu status nas redes sociais, já que, uma vez publicada a modificação, alguém pode fazer um print da página 'só por precaução' e você se arrepender disso no futuro.

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Veja também: doação de pai para filho com reserva de usufruto

sábado, 7 de junho de 2014

Abordagem policial: o direito de revistar pessoas em locais públicos

             
           
               Nos últimos tempos tem havido manifestações de protesto em nosso País e algumas pessoas - a julgar por comentários publicados nas redes sociais - não sabem exatamente o que é que os policiais podem fazer ao abordá-las. Neste post, tentaremos esclarecer alguns pontos sobre esse assunto.

               Antes de prosseguirmos, é importante mencionar de saída que os policiais podem revistar pessoas e coisas - como bolsas, pastas e automóveis - que estejam em público sem a necessidade de nenhum mandado judicial. O mandado judicial só se faz necessário se a abordagem de busca e apreensão tiver que ser realizada em um ambiente privado.

               Assim, se você estiver em uma rua, avenida ou praça - ou em um prédio público ou mesmo em um ambiente privado aberto ao público, como bares, clubes e restaurantes - e um policial mandar você pôr as mãos na parede para revistá-lo, saiba que ele pode fazer isso. Esse poder foi atribuído a ele pelo Estatuto dos Policiais civis, militares ou federais, conforme o caso.

           Agora, se a  função de polícia estiver sendo exercida pelas Forças Armadas por ordem do Presidente da República, os soldados do Exército - ou da Marinha ou da Aeronáutica - também ficam temporariamente investidos dos poderes que competem aos policiais, dentre eles o poder de revistar pessoas ou coisas em locais públicos.

              Se você estiver dirigindo o seu automóvel e um policial mandá-lo parar, você deve obedecer ou então poderá responder criminalmente pela desobediência. O policial poderá pedir os seus documentos - a CNH do condutor e o CRLV do veículo - e poderá mandar você sair do carro para revistar o mesmo. Tal procedimento visa procurar armas, drogas ou qualquer indício de crime. O policial não poderá obrigá-lo a soprar o bafômetro, mas poderá conduzi-lo a uma Delegacia se estiver convencido de que você está embriagado.

              Mencionamos anteriormente que, para que a polícia possa fazer uma revista na casa de alguém, é preciso um mandado judicial. Há algumas exceções a essa regra. Se o proprietário da casa autorizar a revista, os policiais podem fazê-la. Se há indícios de que alguém esteja sendo agredido na casa - como gritos ou som de tiros, por exemplo -, os policiais também não precisam de mandado para agir. E, por último, se alguém foi flagrado cometendo um crime e entrou em uma casa para fugir de policiais que estão em seu encalço, os policiais também não precisam de mandado para entrar na residência e prender o indivíduo.

             Encerrando, se você não tem nada a esconder, é aconselhável que você não resista à revista policial, e que trate o policial com respeito - sem piadas, argumentações e ironias -, pois, se você dificultar as coisas ou xingar o policial, poderá responder por desobediência ou desacato.

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Veja também: cuidado com o status do facebook

sábado, 31 de maio de 2014

Ajudando a solucionar um drama familiar



Atenção: a história narrada abaixo é verídica e nós escondemos a identidade das pessoas envolvidas por uma questão de ética.
            

Doação gravada com as cláusulas de incomunicabilidade e inalienabilidade

       
             O Sr. "A", empresário bem sucedido, desconfiou das intenções de um rapaz, "D", que se descobriu perdidamente apaixonado por sua filha, "J". A nos procurou contando que D era um tanto avesso ao trabalho. Contou também que D e sua filha J estavam de casamento marcado e não havia como demover J da ideia de casar com aquele sujeito.

             - Quero doar um apartamento para a minha filha, porém temo que logo esse sujeito peça o divórcio e fique com metade do imóvel para ele - explicou A.  

             - Bem, ao fazer a escritura de doação, o Sr. deve pedir ao Tabelião que informe no contrato que a doação é um presente de núpcias e faça constar na mesma a cláusula de incomunicabilidade. Assim, caso haja um divórcio futuramente, o apartamento será apenas de sua filha.

             - Certo, mas esse sujeito é manipulador e minha filha é um tanto ingênua. E se ele fizer com que ela assine uma procuração autorizando ele a vender o apartamento?

             - Então, além da cláusula de incomunicabilidade, faça constar também na escritura a cláusula de inalienabilidade, que impedirá a sua filha de vender, doar, dar em hipoteca ou alienar de qualquer modo o apartamento.

             O Sr. A seguiu as instruções recebidas e fez a doação com uma dose menor de preocupação do que antes.

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Veja também: abordagem policial: o direito de revistar pessoas ou coisas em locais públicos

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Valor probante da fotografia

Atenção: Este post dá dicas de como tirar uma fotografia de modo que ela não possa ser impugnada com sucesso pela parte contrária em um processo.

 Introdução

           
             Há um princípio do direito processual civil que diz que a parte que alega um fato deve fazer a prova do mesmo. Por conta desse princípio, cabe ao autor comprovar o fato constitutivo do seu direito, e cabe ao réu provar o fato desconstitutivo do direito do autor. Há regras na lei processual para a produção das provas, bem como para sua impugnação, e, caso tais regras não sejam seguidas, a prova poderá ser retirada dos autos por ordem do juiz, mediante requerimento da parte a quem a prova prejudica.

             Dentre as diversas modalidades de prova, há a prova documental, e, como a fotografia é um documento, às vezes as partes fornecem uma ou várias fotos aos seus respectivos advogados, para que estes juntem tais fotografias aos autos.

             Só que as fotos devem cumprir alguns requisitos para terem validade como prova - ou valor probante, ou força probatória -. Caso uma fotografia juntada aos autos de um processo não cumpra os requisitos legais, a parte contrária poderá impugná-la, requerendo ao juiz que determine que se faça uma perícia na foto - em alguns casos - e que tal prova seja extraída dos autos.


Requisitos das fotos para que tenham valor probante


             Bem, se a fotografia é do tipo analógica, ela deve ser juntada aos autos acompanhada do negativo. E a foto digital? Bem, a foto digital também pode ser juntada aos autos, porém ela não deve ter sofrido nenhuma modificação. No caso da foto digital, além da foto impressa deve ser fornecido também um dispositivo físico (DVD, pen drive, cartão SD, etc) com o arquivo eletrônico contendo a foto em formato TIFF ou JPEG.

             Tanto o negativo, na foto analógica, quanto o dispositivo de armazenamento da foto digital devem ser juntados aos autos para que a parte contrária - a parte que não juntou a foto ao processo e que é prejudicada pela foto juntada - possa verificar se não houve alguma modificação na foto original, pois, como já foi mencionado, se houve alguma modificação na fotografia original, a mesma não é válida como prova e pode ser impugnada. 

             Entenda-se por modificação na foto - referimo-nos agora específicamente à foto digital - qualquer mudança na luz - clareamento, escurecimento -, no contraste, no brilho ou qualquer tipo de modificação feita na foto. Ou seja: o arquivo digital que contém a foto não pode ter sofrido nenhuma alteração.

             Seguindo essas dicas, se você estiver envolvido em um processo, você pode fazer fotografias que dificilmente poderão ser impugnadas pela parte contrária, aumentando suas chances de provar com sucesso a procedência do seu pedido - se você for o autor - ou a improcedência do pedido do autor - se você for o réu.

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Veja também: Frustrando o genro interesseiro


sábado, 17 de maio de 2014

Assaltado na saída do Fórum

OBS: a história narrada neste post é verídica. Trocamos os nomes para evitar a possibilidade de sermos processados, caso os acusados sejam absolvidos.

Como João perdeu mais de R$ 20.000,00


           João da Silva era credor de Antônio das Neves e contratou o advogado Raposo Tavares para ajuizar uma ação de cobrança. Pouco antes da audiência de tentativa de conciliação, as partes entraram em acordo, ficando acertado que Antônio pagaria R$ 35.000,00 a João - valor inferior ao cobrado, porém aceito pelo credor -.

            Entrementes, o advogado Raposo combinou com Afanásio, um bandido que cumpria pena no regime semi-aberto, que, se João saísse do Fórum com dinheiro vivo, Afanásio o assaltaria e dividiria o produto do roubo com Raposo.

            Após a audiência - em que foi feito o pagamento em dinheiro -, João pagou os honorários devidos a Raposo e saiu do Fórum com o restante do dinheiro em uma mochila, indo para casa a pé, uma vez que seu apartamento ficava a poucas quadras do Fórum. Com uma ligação telefônica de Raposo, Afanásio interceptou João e, sob a mira de um revólver, fez com que ele entregasse o celular, a carteira e a mochila com o dinheiro recebido na audiência.

            A Polícia descobriu o envolvimento de Raposo no caso porque tinha pedido anteriormente a quebra do sigilo telefônica deste, por suspeitar que o advogado estava envolvido em negócios ilícitos. Obviamente ele foi expulso da OAB e responde a vários processos criminais, sendo um deles por conta do roubo de que João da Silva foi vítima. Só uma pequena parte do dinheiro roubado foi recuperada.

Como evitar ser vítima de golpe semelhante


            Normalmente há agências bancárias que ficam dentro dos Fóruns.  Abra uma conta de poupança em qualquer agência do mesmo banco do Fórum - p. ex.: se o banco do Fórum for da Caixa Econômica Federal, abra uma conta na Caixa Econômica Federal - e, se a agência estiver aberta ao término da audiência - normalmente essas audiências funcionam em um horário diferente das demais -, deposite o dinheiro recebido na audiência em sua conta, sem carregar uma mochila de dinheiro vivo na rua.

            Caso não seja possível fazer o depósito porque a agência estava fechada ao término da audiência, pegue um táxi assim que sair do Fórum e/ou leve algum amigo policial junto - ele poderá te cobrar por esse serviço e, nesse caso, não barganhe -. E lembre-se: um advogado pode muito bem parecer ser gente boa e não o ser.

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Veja também: valor probante da fotografia