Lei Simplificada

sábado, 6 de setembro de 2014

Como evitar uma multa moratória abusiva



            A multa moratória, ou multa de mora, é a multa pela demora, ou seja: se Divério tem que pagar a Crispim a quantia de R$ 2000,00 até o dia 10 de setembro e fez o pagamento após esse prazo (no dia 15, por exemplo), o valor a ser pago é acrescido da multa de mora de até 2% do montante da dívida - isso se houver uma cláusula contratual prevendo a aplicação dessa multa -. 

             Evidentemente, se o pagamento não for feito mesmo após o vencimento do prazo, também é caso de aplicação da multa de mora sobre o valor do débito. Nessa hipótese, o valor da dívida com os acessórios (multa moratória, juros, correção monetária, etc.) serão cobrados na ação de execução.

        É importante observar que, nos casos de pagamento parcelado - como no financiamento de automóveis, por exemplo -, o inadimplemento (não pagamento no prazo) de uma das parcelas acarreta o vencimento antecipado das parcelas seguintes e é sobre o total da dívida remanescente que será aplicada a multa. 

          Dois por cento sobre o valor devido é o limite máximo estabelecido pelo Código Civil para as obrigações contraídas depois de fevereiro de 2003. Para as obrigações com vencimento em datas anteriores a fevereiro de 2003, o limite máximo era de 20%.             

       Esse limite de 2% não se aplica nos casos de atraso no pagamento de dívidas tributárias, previdenciárias ou trabalhistas porque nesses casos a legislação aplicável não é o Código Civil. 

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Veja também: O dever de imparcialidade das testemunhas

sábado, 30 de agosto de 2014

O pulo de vara

       
       
           Fulano de Tal, advogado, casado com Beltrana de Tal - juíza de uma vara criminal -, recebia altos honorários de apenados para provocar o chamado 'pulo de vara', ou seja: a transferência dos autos do processo de uma vara criminal para outra.

             A juíza Beltrana de Tal, esposa de Fulano, tinha fama de ser muito severa na fase de execução das penas, enquanto que Ciclano, o juiz da outra vara criminal da Comarca, era menos exigente ao conceder benefícios aos apenados, tais como: livramento condicional, progressão de regime - do regime fechado para o semi-aberto e do semi-aberto para o aberto -, etc.

             Fulano não era advogado criminalista, mas, conversando com colegas que atuavam na área Penal, teve uma ideia: ele juntaria uma procuração aos autos de processos criminais em fase de execução - que estavam na Vara em que sua esposa era juíza. Isso obrigaria a juíza a se dar por impedida - por conta da relação conjugal que tinha com o procurador e provocaria o envio dos autos à distribuição para que os mesmos fossem remetidos a outra Vara.

           Uma vez que os autos estivessem na Vara do juiz mais magnânimo, o advogado que defendia o cliente anteriormente juntava uma nova procuração aos autos e o apenado ficava com a vida mais fácil.

           O esquema funcionou por vários anos e em dezenas de processos, até que um promotor decidiu pedir a abertura de inquérito para investigar a ocorrência, em tese, do crime de exploração de prestígio, previsto no artigo 357 do Código Penal: "Solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade, a pretexto de influir em juiz, jurado, órgão do Ministério Público, funcionário de justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha".

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sábado, 23 de agosto de 2014

Dívida de imposto prescrita

          
             
            Em uma das nossas idas ao Fórum, nós presenciamos o seguinte diálogo entre cliente e advogado:

- Mas e a dívida de imposto, doutor? Já faz uns quinze anos que eu não pago o IPTU daquele terreno...

- Pague só os últimos cinco anos, afinal, o imposto referente aos exercícios anteriores há cinco anos atrás está prescrito. 

             Bem, o que o advogado falou pode ser verdadeiro ou não. Há que se fazer alguns esclarecimentos a respeito desse assunto.

          O dever de pagar um determinado imposto surge quando ocorre um fato gerador desse imposto - fato gerador é o fato ou ato previsto na lei como criador da obrigação tributária, p. ex.: no IPTU, o fato gerador é ser proprietário de um imóvel urbano -.

           Explicando de forma simplista: uma vez ocorrido um fato gerador, nasce para a Fazenda Pública o direito de cobrar o valor do imposto correspondente a esse fato gerador e a cobrança do crédito tributário seguirá então duas fases: 

1ª) o lançamento do imposto devido em dívida ativa e; 

2ª) a cobrança do imposto lançado em dívida ativa através de uma ação judicial chamada ação de execução fiscal. Se o contribuinte pagar voluntariamente o débito antes do ajuizamento da execução fiscal, a mesma não é ajuizada por ser desnecessária, como é óbvio.

          A Fazenda Pública não pode fazer a cobrança de um imposto devido indefinidamente, pois há prazos que devem ser observados. A depender das circunstâncias, o crédito tributário pode prescrever, e, se o crédito estiver prescrito, o contribuinte só o pagará se o quiser, uma vez que o Fisco não pode mais ajuizar a ação de execução fiscal.

           Ocorrido o fato gerador, o Fisco tem o prazo de cinco anos pra lançar o imposto devido em dívida ativa. E, a partir do lançamento desse débito em dívida ativa, o Fisco tem outros cinco anos para ajuizar a ação de execução fiscal.

            Vamos dar um exemplo ilustrativo: se um contribuinte deixa de pagar o imposto referente a um fato gerador ocorrido em 2003, a Fazenda Pública tem até 2008 para lançar o débito em dívida ativa e até 2013 para ajuizar a ação de execução fiscal¹. 

            Então, se o fato gerador do imposto ocorreu em 2003 e o Fisco fez a inscrição do débito em dívida ativa em 2010, houve a decadência, ou seja, a perda do direito da Fazenda Pública fazer o lançamento do débito em dívida ativa, pois este lançamento ocorreu depois de decorridos cinco anos do fato gerador. Isso torna a inscrição em dívida ativa nula.

          Ainda nessa hipótese, se o lançamento em dívida ativa ocorreu em 2006 - dentro do prazo de cinco anos - e a execução fiscal foi ajuizada em 2012, ocorreu a prescrição do débito, pois o ajuizamento da execução deveria ter ocorrido no máximo até cinco anos após a inscrição do débito em dívida ativa. 

         Em resumo: se você tem dívidas de impostos decorrentes de fatos geradores ocorridos há mais de cinco anos atrás, consulte um advogado para analisar o teu caso. Talvez essa dívida - ou parte dela - esteja prescrita e você não precise pagar. É interessante observar que, se você pagar uma dívida estando a mesma prescrita, você não poderá ajuizar uma ação de repetição de indébito para reaver o valor pago.

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¹ - Nos casos em que não se sabe a data correta da constituição do crédito tributário, considera-se o 1º dia do ano seguinte ao do fato gerador como a data inicial do prazo de cinco anos para o lançamento do imposto em dívida ativa.

Veja também: Pulo de vara



  

sábado, 16 de agosto de 2014

A retrovenda que não ocorreu: crônica de uma tragédia


              Um advogado, que chamaremos de Raposo da Silva, decidiu se dedicar à agiotagem logo após o início de sua carreira profissional. Emprestava dinheiro a juros e, como garantia, exigia que se efetuasse uma compra-e-venda de um imóvel de propriedade do devedor para si. Para reduzir o receio das vítimas, inseria no contrato uma cláusula prevendo a retrovenda do imóvel para o devedor - o que deveria acontecer assim que o débito fosse pago -.

             Só que, após feito o negócio, quando o devedor queria exercer a pretensão de pagar o débito e recomprar a casa de volta pelo mesmo preço e mais as despesas de transferência conforme acordado, o credor/mutuante nunca estava presente para receber o dinheiro no prazo. Como a intenção do credor não era de receber o empréstimo acrescido de juros e sim de ficar de dono do imóvel - cujo valor era muito superior ao débito em si -, ele sempre estava 'viajando', 'em reunião' ou 'em audiência'. Vencido o prazo para o pagamento do empréstimo, Raposo ajuizava uma ação de despejo e ficava com a casa para si, para fins de locação ou venda. 

         Normalmente as vítimas ficavam com receio de buscar uma solução jurídica para o caso, pois presumiam que não conseguiriam comprovar suas alegações. Talvez estivessem certas, afinal, se a entrega do dinheiro emprestado tinha sido feita em espécie por ocasião do empréstimo - e não por depósito bancário -, como comprovar que a compra-e-venda era só uma simulação para garantir um outro contrato? 

              Após esse golpe ter tido êxito com umas cinco ou seis pessoas, ele foi aplicado no Sr. João, que entrou em desespero ao ser citado da ação de despejo, e ficou de tocaia à noite em uma árvore próxima ao portão da residência de Raposo. Assim que este, ao chegar em casa, desceu do carro para abrir o portão, João disparou seis tiros de revólver calibre 38 no peito dele e fugiu. Posteriormente João foi preso e condenado pelo crime de homicídio.

              Concluindo, se você for tomar um empréstimo e o credor pedir que você passe algum bem para o nome dele, peça a orientação de um advogado de sua confiança. Talvez ele te cobre a consulta e o acompanhamento da lavratura do contrato, mas é melhor investir um pouco em honorários antes de fazer um negócio do que se arrepender depois e perder muito mais.   

sábado, 9 de agosto de 2014

Taxa de evolução de obra: cobrança indevida

Atenção: se você já comprou um apartamento financiado - ou pretende fazer isso no futuro - esse post é do seu interesse.



           Quem já comprou um apartamento financiado pela Caixa Econômica Federal sabe que é cobrada, durante o período de construção do imóvel, a taxa de evolução de obra, a qual corresponde, em média, a 2% do valor do imóvel. No entanto, a cobrança dessa taxa torna-se ilegal quando o consumidor continua a pagá-la após o prazo previsto no contrato para a entrega das chaves. 

           A cobrança da taxa de evolução de obra objetiva pressionar as construtoras a terminar as obras dentro dos prazos estipulados contratualmente, porém é inócua nesse sentido porque quem arca com esse custo é o adquirente do imóvel e não a construtora. Mas, mesmo prevalecendo o entendimento de que o adquirente é obrigado a pagar por um atraso na obra que não é culpa sua - o que, no mínimo, é discutível -, a cobrança da taxa de evolução de obra após o prazo previsto no contrato para a entrega do imóvel é cristalinamente ilegal.

           Esclarecendo: a abusividade da cobrança da taxa de evolução de obra consiste no fato de que, se essa taxa se destina a evitar o atraso da construção e o atraso já ocorreu, então ela passa a ser não somente inútil como também lesiva ao consumidor - no caso, o mutuário -. Em outras palavras: se já houve o atraso então não há como se evitar o atraso. 

           Diga-se de passagem que o pagamento da taxa de evolução de obra, tanto antes do prazo previsto para o término da construção como depois dele, não amortiza o saldo devedor. Donde se conclui que a cobrança dessa taxa serve apenas para aumentar a receita da instituição financeira.     

        Além disso, a aplicação de juros remuneratórios sobre o valor da taxa de evolução de obra é considerada abusiva, pois não se trata, na espécie, de uma operação de mútuo (empréstimo). Ou seja: se a taxa de evolução de obra não é mútuo e sim um ônus que se impõe ao adquirente do imóvel, não se pode cobrar juros remuneratórios sobre esse valor.

            Então quando uma dessas alternativas ocorrer - cobrança após o período definido para a entrega das chaves e/ou aplicação de juros remuneratórios -, o proprietário prejudicado pode ajuizar uma ação judicial requerendo a devolução do valor pago indevidamente em dobro, com juros e correção monetária.

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Veja também: A retrovenda que não ocorreu: crônica de uma tragédia


sábado, 2 de agosto de 2014

A Máfia do DPVAT



         
         Existem no Brasil muitos escritórios especializados em encaminhar pedidos de indenização ao DPVAT. Eles representam, mediante procuração, pessoas que tiveram ferimentos em decorrência de acidentes de trânsito, e, por conta disso, tiveram despesas em hospitais. O trabalho deles é reunir a documentação relativa ao sinistro e às despesas e encaminhar o pedido de reembolso junto a uma seguradora. 

            Em que pese o fato de que a maioria desses escritórios não exerce atividade criminosa, há alguns que são verdadeiras quadrilhas. Há relatos de acidentes de trânsito que teriam sido provocados propositalmente nas principais avenidas das grandes cidades, causando colisão entre dezenas de veículos e levando pessoas a ter ferimentos graves. Então, no meio dos carros danificados, surgem "por coincidência" pessoas com procurações e canetas captando clientes. Na maioria desses casos, a vítima recebe pouco ou nenhum dinheiro da indenização. 

             Esses escritórios - que os funcionários das seguradoras já apelidaram de abutres - têm advogados em seus quadros que vão até as últimas consequências para receber as indenizações (incluindo ameaças e agressões físicas), e contam com a cumplicidade de funcionários de seguradoras, socorristas, médicos e funcionários de hospitais. Superfaturar as despesas e falsificar os prontuários, declarando a realização de procedimentos que não foram efetuados é ocorrência corriqueira. 

             E o que o cidadão comum pode fazer a respeito? Bem, na hipótese de se envolver em um acidente de trânsito, não se deve assinar de imediato nenhuma procuração a quem quer que seja. Se após a internação a pessoa tiver tido despesas e quiser o reembolso das mesmas, então pode procurar uma seguradora e encaminhar os documentos requeridos sem ter que usar intermediários e pagar comissão.

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Mais detalhes sobre o DPVAT em: http://www.denatran.gov.br/dpvat.htm

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Uma hipótese de revisão de contrato



           

1 - O Princípio da Força Obrigatória dos Contratos

         
          Os romanos acreditavam que, uma vez que alguém tivesse celebrado um contrato ou acordo de vontades, o mesmo teria que ser cumprido, por ter tal contrato força obrigatória. Pacta sunt servanda, diziam eles, entendendo que o contrato tinha força de lei entre as partes. Esse princípio da força obrigatória dos contratos era decorrência lógica de um outro: o princípio da autonomia da vontade ou princípio da liberdade negocial.

2 - O Princípio da Autonomia da Vontade


             O princípio da autonomia da vontade dispõe que ninguém é obrigado a celebrar um contrato, tendo as partes liberdade para aderir a um pacto ou não, negociando as suas cláusulas conforme o desejarem¹. Em decorrência disso, uma vez que um contratante tenha aderido a um determinado acordo de vontades voluntáriamente, tendo plena consciência dos direitos e das obrigações decorrentes desse contrato, não se pode excusar de cumpri-lo, ainda que após a celebração do contrato venha a se arrepender².    

3 - A Teoria da Imprevisão


           Porém há alguns contratos cuja execução se prolonga no tempo - como no caso da promessa de compra e venda de um imóvel em que o pagamento é dividido em dezenas ou centenas de prestações periódicas. E às vezes ocorre, nessa espécie de contrato, que as condições de cumprimento do contrato se alteram sensívelmente decorrido algum tempo após a sua celebração.

         Exemplificando: imaginemos que Vânio prometa vender a Celso um apartamento, cujo preço é dividido em prestações periódicas que totalizam R$ 300.000,00. Então, 1 ano após a celebração desse contrato de promessa de compra e venda, o Município constrói um viaduto ao lado do prédio, permitindo que automóveis passem a menos de cinco metros da janela da sala de estar desse apartamento.
   
             Na hipótese descrita acima, é evidente que Celso, o promitente comprador, teve um prejuízo, pois o imóvel se desvalorizou sensívelmente após a celebração do contrato. Caso ele não tivesse terminado de pagar as prestações e a construção do viaduto não pudesse ser prevista antes da celebração do contrato, Celso poderia ajuizar uma ação pedindo ao juiz que revisasse o contrato, ajustando o preço do imóvel à nova realidade. 

4 - Conclusão       


            Resumindo: se a execução de um contrato se prolonga no tempo, e, após a celebração, ocorrem mudanças imprevistas nas condições de cumprimento desse contrato, o mesmo pode ser revisado judicialmente .


¹ - A possibilidade de se discutir cada cláusula do contrato não é a regra nos chamados contratos de massa, ou seja, nos contratos de consumo, principalmente naqueles contratos que envolvem a prestação de serviços públicos por empresas são a única opção do contratante - como o serviço de fornecimento de água, por exemplo.

² - Existe a possibilidade de se incluir no contrato uma cláusula que estipule às partes o direito de arrependimento. 

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Veja também:
A Máfia do DPVAT
A Assistência Judiciária Gratuita