Atenção: antes de ler o texto abaixo, saiba mais sobre precatórios clicando aqui, aqui e aqui.
Alguns leitores nos contataram em privado perguntando sobre o significado de algumas expressões usadas na reportagem (litisconsórcio ativo facultativo, precatórios e requisição de pequeno valor). Decidimos então escrever este post, afinal, a página é destinada justamente a quem não é da área jurídica.
Vamos abordar os assuntos por partes:
1 - Litisconsórcio ativo facultativo
Ocorre litisconsórcio quando há mais de um autor - litisconsórcio ativo - e/ou mais de um réu - litisconsórcio passivo - no mesmo processo.
Exemplos:
a) Litisconsórcio ativo: João tem um crédito contra Paulo e vem a falecer. Então todos os herdeiros de João - Mateus, Marcos e Lucas - ajuízam uma ação contra Paulo visando a cobrança dos valores que este (Paulo) devia ao de cujus (João).
b) Litisconsórcio passivo: João está em débito com um banco e vem a falecer. Como os herdeiros respondem pela dívida do falecido até o limite das forças da herança, o banco ajuíza uma ação de cobrança contra todos os herdeiros do devedor - na hipótese, Mateus, Marcos e Lucas -.
Se o litisconsórcio decorre da lei - como nos exemplos acima -, se trata de um litisconsórcio necessário. Já nos casos em que a lei permite que haja uma ação separada para cada parte e as pessoas optam por litigar em conjunto, se trata de um litisconsórcio facultativo. Normalmente são os advogados que tomam a decisão de reunir várias pessoas no polo ativo ou no polo passivo de uma ação e o fazem por economia de material/trabalho.
Exemplificando: o advogado Pandolfo, conhecido por mover ações contra empresas de telefonia, recebe, em um breve espaço de tempo, procurações de 100 clientes que foram prejudicados pela empresa Sinalruim. Então, ao invés de ajuizar 100 ações com um cliente em cada, ele ajuiza 10 ações com 10 clientes em cada uma. Assim, quando ele tiver que fazer petições, por exemplo, ele terá que fazer 10 petições ao invés de 100. E como se trata de ações movidas contra a mesma empresa, isso é juridicamente possível.
2 - Precatórios
Os precatórios judiciais são a forma da Fazenda Pública pagar as dívidas que possui em decorrência da perda de ações judiciais. O procedimento para se executar um crédito contra o Estado – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – é diferente do procedimento utilizado para se executar um crédito contra uma pessoa física ou contra uma empresa.
Quando uma pessoa física ou uma empresa perde uma ação judicial e essa ação vai para a fase executiva – fase de cobrança -, são os bens da pessoa que respondem pelo débito. Ou seja: o juiz, a pedido do exequente/credor, determina que o Oficial de Justiça penhore bens do devedor. A seguir, os bens são leiloados e, do dinheiro arrecadado com o leilão, pagam-se o débito, as custas judiciais e os honorários devidos ao advogado do exeqüente – chamados honorários sucumbenciais -. Caso sobre algum valor após serem pagos todos esses encargos, o que sobra é devolvido ao devedor.
Só que quando o Estado perde uma ação judicial e esta, depois de esgotados todos os recursos, vai para a fase de cobrança, há um obstáculo: os bens públicos não são passíveis de penhora. E então, como é que se faz para que o credor receba o que lhe é devido? Nesse caso, o juiz, a pedido do exequente, manda o Escrivão do cartório da vara onde atua enviar um ofício ao Tribunal, requerendo a expedição de um precatório judicial em favor do credor. Lá na Secretaria de Precatórios, esse pedido entra em uma fila em ordem cronológica e fica esperando a sua vez de ser pago.
A Fazenda Pública não paga os precatórios com a celeridade que deveria. De fato, por lei, os precatórios inscritos no orçamento até a metade de 2014 – por exemplo – deveriam ser pagos até o fim de 2015. Mas não é isso o que acontece na prática. Há precatórios que levam décadas para serem pagos.
Isso ocorre porque esses pagamentos dependem do valor destinado a eles na lei orçamentária e, para os administradores públicos, fazer asfalto de baixa qualidade dá mais voto do que pagar precatórios. Por conta dessa demora, criou-se um mercado de compra e venda de precatórios, que mencionamos nos posts indicados acima da foto do início deste post.
3 - Requisição de Pequeno Valor
Se alguém é credor do Estado até um certo limite, poderá requisitar que se faça a execução contra a Fazenda Pública mediante requisição de pequeno valor - RPV -. A requisição de pequeno valor evita a expedição de precatório e normalmente é paga em poucos meses, evitando que o credor tenha que esperar anos e anos pelo pagamento de um precatório.
É importante observar que, se alguém tiver um crédito de valor superior ao limite da RPV, ele poderá renunciar a parcela do crédito que passa desse limite para requerer a expedição de uma requisição de pequeno valor e receber seu crédito - ou a parte que sobrou após a renúncia - de forma mais rápida.
Os limites para que seja possível requisitar a RPV são os seguintes:
a) Até 60 salários mínimos, se o crédito for contra a Fazenda Pública federal;
b) Até 40 salários mínimos¹, se o crédito for contra a Fazenda Pública estadual;
c) Até 30 salários mínimos², se o crédito for contra a Fazenda Pública municipal.
Para concluir, e retomando a notícia do Conjur mencionada no início do post, o que o STF decidiu é que, se em uma ação contra a Fazenda Pública há mais de um autor em litisconsórcio facultativo e o crédito de cada um deles é inferior ao limite da RPV, o pagamento não precisa ser feito por precatório, podendo ser feito por RPV.
¹ - Esse limite só é válido se não houver lei estadual estabelecendo outro valor.
² - Esse limite só é válido se não houver lei municipal estabelecendo outro valor.